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Sobre os Políticos

Há tempos estou à procura de uma fonte que me desse conteúdo a respeito desse personagem tão importante para as nossas vidas, mas que tudo indica estar cada vez mais distanciado de nós. Finalmente encontrei um local que me forneceu as opiniões que abasteceram a minha limitada profundidade no assunto: Uma entrevista no site Persuation, de Yascha Mounk, com o escritor, diplomata e político Rory Stewart. 

Ex-secretário de Estado para o Desenvolvimento Internacional no Reino Unido, Rory Stewart é hoje presidente de uma instituição de caridade global de alívio à pobreza, a GiveDirectly (DêDiretamente em tradução Livre) e autor do recente livro How not to be a Politician, a Memoir (algo como "Como não ser um Político, um livro de Memórias"). A entrevista é longa e eu me impressionei com ela a ponto de me atrever a fazer um resumo.

Pelo que entendi, com o livro Stewart faz uma descrição de suas experiências na política do Reino Unido. Ele inicia a entrevista falando da brutalidade da política, já que a forma como ela é feita a torna muito destrutiva para quem a pratica, e o eleitor é o maior prejudicado. As personalidades que emergem da política atual são em geral personalidades estranhas, incapacitadas para exercer a governança. Isso se dá porque as competências necessárias para se eleger não estão em sincronia com as competências fundamentais para se administrar ou governar bem uma comunidade ou um país.

O processo que seleciona um político é diferente daquele que seleciona por exemplo um CEO de uma empresa. Aqui você é selecionado por um sistema partidário, e nele o importante é em que tipo de pessoa o partido está interessado. Para ele é fundamental se envolver na política partidária muito cedo e demonstrar lealdade, e isso deve se iniciar com um esforço em ter seu nome conhecido nas redes sociais, quase sempre por meio de comentários fortes, com uma visão binária sobre qualquer assunto, que não admite profundidade, dúvida, ou humildade, que está absolutamente confiante na sua visão do mundo.

Segundo Stewart é esta a máscara que deve ser usada para se eleger, só que quando tiram a máscara e se sentam à mesa de um gabinete o veneno que estava impregnado na máscara continua em seu rosto. E aí vem o conflito, porque o pensamento crítico é o oposto de tudo isso. Surge a complexidade, eles têm que ser humildes, que estar abertos às ideias dos outros, a mudar de ideia. Eles têm que mergulhar nas nuances e nos detalhes, e nem o Boris Johnson, nem o Donald Trump, nem o Jair Bolsonaro estavam preparados para isso (o camaleão Lula é uma caso a parte porque para ele esse diagnóstico varia com o mandato, que já são quatro se incluirmos o da "Poste").

Embora o populismo de esquerda esteja estabelecido, esse fenômeno agora é particularmente forte na direita. Em particular no nosso continente Latino Americano esses excêntricos pululam, e causaram e podem causar muitos danos. Querem alterar a Constituição, ou fechar o Banco Central, mas ao chegarem ao poder fazem muito pouco e causam muito prejuízo. O problema dos populistas de direita é que a direita sempre foi tradicionalmente conservadora, mostrava respeito pela história, pela tradição, e o que vemos nesses líderes de araque é que a defesa do status quo, uma atitude evolutiva em relação à política, por alguma razão se inviabilizou e deixou de ser popular, e a direita perdeu a âncora e assumiu uma mentalidade revolucionária, estranhamente se posicionando numa defesa hipócrita do povo contra a elite, atributos que ela sequestrou da esquerda.

Ela passou a se apresentar como nacionalista, anti-imigração. Em nosso quintal ela capturou até as cores e a bandeira nacionais. Ela também conquistou aquela parcela enorme do cristianismo pouco esclarecido que quer retornar aos tempos da idade média, em que os ateus e as bruxas eram queimados e o homossexualismo era julgado pelo livro do Levítico. A nível dos países ditos "brancos" foi criado um nome para esse fenômeno: WASP, que é o acrônimo inglês para "Branco, Anglo Saxão e Protestante", e a política consensual dos anos 1990, conduzida por Bill Clinton, Tony Blair, políticos com base no centro, foi eliminada. Esse momento da política global deixou saudades, mas criou algumas crenças que hoje temos dificuldade em defender:

  • A de que o crescimento econômico é alcançado através de uma visão de mercados livres e comércio global.
  • Que o crescimento econômico e a prosperidade conduziriam à democracia.
  • Que a democracia ocidental era legítima e justa.
  • Que haveria uma ordem global liberal que iria incorporar o caminho para a democracia e os mercados.
  • E o mais importante, que chegaríamos a um consenso a respeito de tudo isso, que os eleitores tenderiam para o centro, e  opinião pública daria muito poucos votos para as politicas extremistas.
Houve até quem chegou a decretar o fim da História. Porém a entrada no século XXI destruiu paulatinamente todas essas crenças:
  • Em 2008 a crise financeira levou por terra as teorias sobre a globalização da economia.
  • A ascensão da China rompeu os laços entre economia e democracia.
  • As guerras do Iraque e do Afeganistão puseram em cheque a ideia de uma ordem global mundial.
  • Os movimentos tipo Black Lives Matter, a crescente conscientização da Europa e dos Estados Unidos dos problemas encontrados em suas sociedades destruíram a confiança no sistema.
  • E também o mais importante, as redes sociais eliminaram a possibilidade de um consenso e transformaram o pensamento das sociedades em uma forma de U, com os votos migrando para os extremos e o centro quase totalmente vazio.
O reconhecimento desse fracasso é essencial para concluirmos que não existe mais espaço  para Clintons, Blairs, e no nosso caso um novo Fernando Henrique, e temos que oferecer algo diferente para sairmos deste buraco criado pelo U polarizador descrito acima.

A primeira coisa a ser feita por aqueles que lidam com a política de forma moderada é não esconderem o fato de que muita coisa deu errado, não tratarem esses erros de forma complacente, não se esconderem atrás da velha cortina que diz que a Democracia deve estar acima de tudo. Ela está, mas os erros cometidos em nome dela têm que ser reconhecidos e devidamente sanados.

O fracasso tem que ser reconhecido. As nossas instituições estão degradadas, nosso sistema prisional não funciona, a pobreza chegou a níveis inaceitáveis há tempos, as pessoas perderam o rumo, agredidas pela perda dos empregos e por não terem recebido o que lhes foi prometido. Essa bandeira foi comprada pelas extremidades do U em que se transformou a nossa sociedade, e quem permaneceu no centro do U virou pó e não tem alternativa a não ser fingir que está defendendo a Democracia.

O que então restou ao centro? A moderação, o argumento racional sobre a maneira correta da fazer as coisas, devemos resgatar a emoção e a capacidade de comunicá-la. Tudo isso foi perdido pelos que praticam a moderação e desconsiderado pelos inconsequentes.

Toda a arenga acima é, como disse, a opinião do político frustrado inglês Rory Stewart, na qual eu tomei a liberdade de assinar embaixo. O que eu consigo observar, dado o meu limitado acesso aos locais onde acredito que os governos se saem relativamente bem, é na verdade o óbvio: Quanto menos diferentes os programas daqueles partidos que se alternam no poder, maior a probabilidade da sociedade ser bem atendida. As nações que praticam o que podemos considerar a democracia desejada se esforçam para não alterar muito o rumo tomado pelo mandato anterior. Elas já amadureceram o suficiente para saber que grandes mudanças resultam em pura perda de energia, com pouco retorno.

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Esta é a encruzilhada em que as democracias agredidas pela polarização se encontram, e elas são muitas, as mais importantes, e perderam a autoridade intrínseca que já possuíram. Nos Estados Unidos o chamado Centro politico se tornou tão fraco que o país caminha para o retorno do Trumpismo. O Partido Republicano não tem a coragem de isolar Trump, e o Partido Democrata vacila em apoiar um Presidente que está altamente impopular. Ou seja, a gangorra ideológica pode trazer de volta um governo que vai mais uma vez desfazer tudo o que fez o atual. Não existe em ambos os lados aquela disposição de um Obama, que teve a coragem de colocar um Republicano como Secretário da Defesa (Robert Gates 2006 - 2011, e Chuck Hagel 2013 - 2015).

As mudanças necessárias ao Brasil para mudar com rapidez o rumo que a sociedade está fadada a tomar são tão grandes que por um momento me sinto totalmente pessimista. Vamos começar pelo Poder Legislativo. O Presidente do Senado, defendendo a sua iniciativa de intervir politicamente no Judiciário, declarou ser seu Poder o representante legítimo do Povo Brasileiro, donde as inciativas do Legislativo são necessariamente as iniciativas do Povo.

Não é verdade. O Legislativo é um grupo de pessoas que de forma alguma representa a Sociedade Brasileira. Está certo que nossa sociedade e heterogênea, mas termos 30 partidos políticos legalizados não faz o menor sentido, e obriga o Executivo a inchar a administração do país de ministérios, para distribuí-los entre esses partidos, com o intuito de conquistar um número suficiente deles para apoiá-lo. Isso torna a condução dos serviços do Executivo um bate cabeça que é percebido pelo eleitor, e eu desafio você a encontrar um único eleitor comum que concorde com essa situação. Então a primeira coisa a fazer seria criar uma cláusula de barreira efetiva que diminuísse drasticamente o número de partidos.

Outra coisa a ser feita é diminuir a distorção existente na representação dos estados na Câmara:


O que vemos neste quadro feito pela Agência Câmara é que um candidato de Roraima precisa em média de 72.000 votos para se eleger, enquanto um candidato de São Paulo precisa de 650.500.. Esse absurdo foi inventado pelo regime militar que tivemos, que para ganhar maioria na Câmara Federal impôs uma representação mínima de 8 por Estado. Resumindo, o voto de Roraima para Deputado Federal vale 9 vezes mais que o voto Paulista.

Mas isso não é tudo. Ao votar para Deputado Federal você na verdade não está votando no candidato, mas sim na legenda do seu partido. A coisa melhorou um pouco a partir de 2020, quando foi exigido que o candidato beneficiado pelo voto na legenda teria que cumprir uma cláusula mínima de desempenho para receber os tais votos da legenda. Houve ocasiões em que um tal Enéas em São Paulo conseguiu colocar na Câmara Federal candidatos que receberam menos de mil votos.

Aqui a solução desse problema é estabelecer o Voto Distrital. Ela é de uma simplicidade total face a complexidade do voto de legenda. São 513 vagas para Deputado Federal. Cada Estado recebe as vagas proporcionalmente á sua população. O Estado A recebe X vagas e divide essas vagas por X Distritos, e o candidato desse Distrito tem que angariar votos apenas dentro dele. Senhores Parlamentares, aprovem essa mudança e lhes será dada a outorga de LEGÍTIMOS REPRESENTANTES DO POVO no Congresso. 

Já o Senado é mais complicado. O número de Senadores no Nordeste é enorme em relação ao Sudeste e Sul. Bom lembrar que o Senado é composto de representantes dos Estados da União, e a Câmara representa (em tese) a sua população. Então aqui a solução seria uma utopia de mesclar os estados miúdos, ou então dividir os graúdos. Alguém se atreve?

A meu ver em um país com a nossa Democracia isso seria a Missão Impossível. A China resolveu esse assunto da forma mais simples, como foi mostrado em Post Anterior:


Se você tiver a disposição de reler o que escrevi em novembro de 2020, ótimo. Se não vou dar um resumo daquilo que reforça o meu raciocínio:

A China, com quase 7 vezes a população do Brasil, possui 333 prefeituras, que incluem diferentes tipos de cidades, sendo as mais comuns as Cidades Prefeitura e os Distritos dos Municípios.

Aqui surge a grande diferença entre o Brasil e a China. Vou citar um exemplo: Bruno Covas é o Prefeito de São Paulo, cidade mais de 12 milhões de habitantes. Paulo Barboza é o Prefeito de Águas de São Pedro, o menor município de Estado de São Paulo em área, que possui uma população de 2.700 habitantes. Ambos possuem pela lei o mesmo status. O resultado disso é que o Brasil tem 5.770 prefeituras nos seus 26 Estados Federados, ou seja, o primeiro nível que define a municipalidade no Brasil é muito heterogêneo.

Temos no Brasil em média um Prefeito para cada 36 mil habitantes, enquanto a China tem um Prefeito para cada 4,2 milhões de habitantes. Minha conclusão é que a solução chinesa deve ser melhor. Vejamos por exemplo a Região Metropolitana de Campinas (RMC), onde moro, com 20 municípios e 3,2 milhões de habitantes. Muitas vezes não dá pra saber em que município eu me encontro, mas a administração é diferente do outro lado da rua.

Na China a RMC seria uma Prefeitura. É bom observar que a densidade populacional da China é 7 vezes maior que a nossa e não faria sentido do ponto de vista administrativo ela possuir por exemplo 40 mil prefeituras (proporcionalmente às 5.770 no Brasil), A solução foi dividir o território chinês em prefeituras mais homogêneas, numa quantidade administrável, e criar dois níveis administrativos inferiores.

Como vimos a reestruturação nesse caso foi feita de baixo pra cima. Caso nós chegarmos a uma solução semelhante a essa, as representações no Senado seriam homogêneas.

Já no Executivo a coisa pode se resumir a uma única palavra: Desigualdade.  nada melhor que uma lei tributária que acabe de vez e rapidamente com o recolhimento do imposto na origem. A coisa está tão difícil e a mudança proposta é tão lenta e tão centralizada que mais uma vez o meu pessimismo aflora. Os pontos que eu considero mais discutíveis são:
  • Nada foi feito em relação ao imposto sobre heranças, e ser contra o imposto sobre heranças para mim é ser a favor da enorme desigualdade atual.
  • Sua arrecadação está centralizada na União, e isso vai com certeza retirar autonomia dos estados e municípios, e é perigoso do ponto de vista institucional
  • Ela prevê um enorme período de transição para a extinção de cinco impostos atuais e a inclusão de novos tributos. Se aprovada em 2023 a transição só se iniciará em 2026 e se estenderá até 2033. Mas a transição que interessa, a da cobrança do imposto na origem para o imposto no destino, será escalonada ao longo de 50 anos.
  • Ela pra variar na verdade se complica com propostas demagógicas. Uma mente brilhante chegou a inventar um tal cashback que transforma imposto em consumo em certos produtos, o que vai abrir uma janela para todo tipo de manobras.
Não consigo entender uma Reforma Tributária com esse tempo de transição que nada diz a respeito do impacto da automação no sistema produtivo, mas isso é assunto para outro Post.

Já no Judiciário eu tenho um caso a contar (Juiz não devia ser politico, mas hoje temos uma relação complicada nesse campo aberto do Judiciário com os outros dois Poderes): Uma professora de Leopoldina (MT) cobrou das autoridades o cumprimento das suas obrigações em relação às condições do sistema carcerário de sua cidade. Ela foi por isso condenada a 4 meses de prisão. Minha posição é a mesma de um advogado da minha cidade, que em artigo publicado no Consultor Jurídico a respeito desse caso, deixa claro que o Poder Judiciário não pertence aos que o representam, mas sim à Nação. Ao criticar a cadeia de uma cidade eu estou tomando uma atitude política, e essa atitude não dá motivo a um juiz de me colocar na cadeia, Seria o mesmo que eu ser processado por criticar os buracos da rua onde moro. 

O Supremo Tribunal Federal acaba de passar por uma mudança de comando. Se eu fosse membro do STF, nos meus 80 anos, já estaria de pijama há 5 anos. Ao contrário daqui, nos Estados Unidos um Juiz da Suprema Corte só sai dela no caixão ou com pedido de aposentadoria. Mais que isso, aquela afirmação de que o juiz só deve se pronunciar através dos autos por lá é seguida com mais seriedade.

Acho melhor ficar por aqui.








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