Pular para o conteúdo principal

Polarização e Pandemia

Lourival Sant'Anna é um colunista do Estadão que nunca deixo de acompanhar. Seu site http://www.lourivalsantanna.com/ dá uma ideia da experiência que esse jornalista tem na cobertura dos grandes eventos mundiais. 

Na sua coluna de 26/04 ele tece considerações a respeito da oportunidade que estamos perdendo de aproveitar a crise pela qual estamos passando, a Pandemia do Coronavirus, para lamber nossas feridas e unir a orientação dos nossos conceitos no sentido de melhorar nossa condição como sociedade. 

A coluna citada tem o mesmo nome desse Post: Polarização e Pandemia. então eu tomei a liberdade de solicitar no seu site autorização para usar o mesmo título e também discorrer sobre o que ele defende. 

Até o dia em que postei esse Artigo ainda não tinha tido retorno, então vamos em frente. Lourival começa citando o historiador australiano Geoffrey Blainey, que conseguiu traçar um paralelo entre otimismo/guerra e pessimismo/negociação. Ou seja, um país se aventura em numa guerra apenas se o otimismo está em alta e ele tem uma visão positiva a respeito da sua capacidade de enfrentar o adversário com vantagem. Por outro lado quando um país se encontra numa situação de crise a sua propensão a negociar cresce. 

Hitler por exemplo agiu com muita habilidade quando levou a sociedade alemã a acreditar que seria capaz de tentar pela segunda vez se tornar a regente máxima da Europa, enquanto os grandes impérios europeus, Reino Unido, França, Rússia, tentaram a negociação até o seu limite máximo por entenderem que o inimigo estava mais preparado para a guerra. 

Vamos trazer esse paralelo para os dias que estamos vivendo, analisando a política interna dos países e como eles estão tratando a pandemia da COVID. Estamos falando do maior desafio já enfrentado desde a segunda guerra mundial, e é claro que existem divergências em como tratar esse problema, mas a tendência é não levar essa discussão para o campo político. Os líderes que tomaram esse caminho certamente vão ser julgados pela sociedade, mais cedo ou mais tarde, e a hora de pagar essa conta varia com a capacidade da sociedade de se desligar das mensagens geradas pela máquina que suporta o líder.

Nos Estados Unidos, um exemplo claro de polarização política, o governo tem tido certa facilidade em aprovar no Congresso, onde é minoria, todas as propostas necessárias ao enfrentamento da Covid. Na Espanha e na Itália, dois países que passam por um período de grande instabilidade política, cuja causa foi a geração de um número de partidos minoritários que dificultaram a criação de coalizões que gerassem um governo capaz de "governar", a Covid chegou e de forma surpreendente acalmou o ambiente político. Na França os coletes amarelos que infernizavam o governo de Emmanuel Macron deixaram de fazê-lo em função da pandemia. 

Na nossa vizinhança a Argentina, um modelo de polarização que acabava de eleger um peronista, o que levou o Brasil a cometer a indelicadeza de seu  Presidente não comparecer à sua posse, está totalmente concentrada no enfrentamento da doença. O Chile adiou um plebiscito que seria feito em abril sobre a reforma da Constituição e ninguém levantou questionamento junto ao Presidente Piñera. A Bolívia com um governo interino acusado de golpe suspendeu as eleições marcadas para maio e ninguém reclamou.

Mas o maior exemplo vem de Israel, que desde setembro não conseguia formar um governo. A pandemia conseguiu o inimaginável de juntar o Primeiro Ministro Binyamin Netanyahu e seu adversário Benny Gantz, que formaram um governo de união nacional. 

Gantz & Netanuahu


Tudo isso aconteceu graças ao coronavírus. A disputa pelo poder foi deixada de lado (em termos) para que a sociedade se espelhasse em suas lideranças e enfrentasse a pandemia num clima, não diria de tranquilidade, mas sim de confiança nas suas lideranças.

E como fica o nosso Brasil nessa orquestra que juntou todos os seus instrumentos de forma a tocar uma sinfonia capaz de enfrentar essa enorme crise? Mal, muito mal. Entre todas as democracias ele foi a que conseguiu manter expostas as suas diferenças politicas de forma tal que levou a sociedade a não saber até agora que direção seguir.

O Ministro da Saúde sangrou até cair e foi substituído por outro que durou um mês. O Presidente participou de manifestação que pedia o fechamento do Congresso e da Corte Suprema. A interferência na Polícia Federal resultou na saída do Ministro da Justiça, a figura mais popular e admirada do Poder. 

Fora isso o Brasil é também o país cujo governo menos leva a sério a Covid, talvez até porque ela chegou em boa hora no que tange a fixação do governo em manter acesa a ideia de que o confronto é a melhor ferramenta. 

Lourival Santana cita um caso acontecido em 1985. Os presidentes Ronald Reagan e Mikhail Gorbachev se reuniram em Genebra para discutir um tratado de redução de armas nucleares. As negociações estavam travadas. Reagan então convidou Gorbachev para passear no belo lago de Genebra e lhe fez a seguinte pergunta:

- Se os Estados Unidos fossem invadidos por alienígenas, a Rússia viria nos defender?
- Com certeza, 
- Sinto a mesma coisa com relação a vocês. 

Destravou. 

Não foi preciso que uma invasão alienígena viesse a ocorrer para que as nações de todo o mundo se juntassem no combate a um inimigo comum. Existem infelizmente duas nações democráticas que podemos considerar exceções:

- O atual Império, que encara a pandemia como uma arma do seu eventual substituto.
- O nosso pobre Brasil, cujos governantes ainda não chegaram a um acordo sobre o significado dessa pandemia.

E qual seria esse significado? A resposta está nas conclusões de Goeffrey Blainey: o pessimismo é uma poderosa arma a favor da negociação. Ou se preferirem o lugar comum, crise é oportunidade de mudança. 

PS1 - Por falar em invasão alienígena, está circulando por aí a teoria que esse vírus é uma arma alienígena para destruir a humanidade (ponto para Ronald Reagan):

https://www.tecmundo.com.br/ciencia/151284-virus-alienigena-arma-biologica-teorias-conspiratorias-covid-19.htm

PS2 - Carta enviada a Louruval Santana

Caro Senhor Lourival
Sou engenheiro aposentado, 77 anos, e acompanho com muita satisfação a sua coluna de domingo do Estado de São Paulo. A do dia 26 de abril em particular me chamou a atenção pelo seu conteúdo, que traduz muito bem a situação a que chegou a nossa sociedade dividida, num momento em que ela tinha por obrigação aproveitar essa oportunidade de crise aguda para se unir. 
Tenho um Blog, o CeticoCampinas (, https://ceticocampinas.blogspot.com/) que uso para transmitir aos que se atrevem a ler meus rascunhos a minha forma de pensar, mas também aquilo que leio e com o que concordo. O Post de 23/05 será uma crítica com base na sua coluna mencionada acima, onde eu espero com sua permissão fazer chegar os seus argumentos àqueles que leem meu Blog.
Atenciosamente

Luiz Fontenelle - CeticoCampinas

Comentários

  1. Os diarios do Presidente Reagan sao otima leitura para quem gosta de biografia e politica. Ele escrevia com bastante regularidade, o que alias e um habito de varios bons lideres.

    ResponderExcluir
  2. Existem pesquisas que estão identificando a polarização como consequência das redes sociais, ou seja, ela é um fenômeno global. Mas porquê no Brasil ela está tão exarcebada? Alguns diriam que a explicação está no estilo do Bolsonaro. Mas eu diria vai uma pouco além, que este senhor agressivo e despreparado foi eleito pela teimosia da esquerda insistindo em trazer de volta ao poder aquele ex-presidente condendado por corrupção.

    ResponderExcluir

Postar um comentário

Postagens mais visitadas deste blog

A Europa Islâmica

É irreversível. A Europa, o berço da Civilização Ocidental, como a conhecemos, está com seus dias contados. Os netos dos nossos netos irão viver em um mundo, se ele ainda existir, no qual toda a Europa será dominada pelo Islamismo. Toda essa mudança se dará em função da diminuição da população nativa. Haverá revoltas localizadas, mas o agente maior dessa mudança responde por um nome que os sociólogos têm usado para alertar para esse desfecho: a Demografia. Vamos iniciar este Post com um exercício simples. Suponhamos uma comunidade de 10.000 pessoas, 5.000 homens e 5.000 mulheres, vivendo de forma isolada. Desse total metade (2.500 homens e 2.500 mulheres) já cumpriu sua função procriadora, e a outra metade a está cumprindo ou vai cumprir. Aqui vamos definir dois grupos, o velho não procriador e o novo procriador. Se os 2.500 casais procriadores atingirem uma meta de cada um ter e criar 2 filhos, teremos como resultado que, quando esta geração envelhecer (se tornar não procriadora), a c

Sobre os Políticos

Há tempos estou à procura de uma fonte que me desse conteúdo a respeito desse personagem tão importante para as nossas vidas, mas que tudo indica estar cada vez mais distanciado de nós. Finalmente encontrei um local que me forneceu as opiniões que abasteceram a minha limitada profundidade no assunto: Uma entrevista no site Persuation, de Yascha Mounk, com o escritor, diplomata e político Rory Stewart.  Ex-secretário de Estado para o Desenvolvimento Internacional no Reino Unido, Rory Stewart é hoje presidente de uma instituição de caridade global de alívio à pobreza, a GiveDirectly (DêDiretamente em tradução Livre) e autor do recente livro How not to be a Politician, a Memoir (algo como "Como não ser um Político, um livro de Memórias"). A entrevista é longa e eu me impressionei com ela a ponto de me atrever a fazer um resumo. Pelo que entendi, com o livro Stewart faz uma descrição de suas experiências na política do Reino Unido. Ele inicia a entrevista falando da brutalidade

Sobre o Agronegócio

A nossa sociedade, a nível global, está passando por um processo desafiador a respeito do nosso comportamento, onde as ferramentas, que foram criadas para melhor nos informar, nos desinformam. Uma das questões que se apresentam é: por que discutimos?  Vamos concordar que se não discutíssemos o mundo seria diferente, mas não tenho muita certeza se ele seria melhor. A discussão é uma forma de vendermos o nosso entendimento das coisas, na esperança de arrebanhar adeptos para ele. Para tanto lançamos a nossa opinião sobre um assunto e aguardamos o efeito que ela faz. Hoje em dia isso está se tornando uma missão quase impossível, porque se tornou lugar comum sermos impedidos de levar o nosso raciocínio em frente, com interrupções constantes, que são a arma utilizada para nos desqualificar de antemão, nesse ambiente tóxico que estamos vivendo. O ideal a meu ver seria voltarmos à velha fórmula de comunicação via rádio, em que nossas falas terminariam com a palavra "câmbio", a qual s