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A Festa de Guapé

Minha Filha mais nova se mudou para Guapé há anos. Guapé é uma cidadezinha situada na represa de Furnas, 50 quilômetros ao norte de Boa Esperança, no lado sul da represa. Embora fique a apenas 400 quilômetros de Campinas, em estrada asfaltada, ou a 290 quilômetros da Capital Belo Horizonte, Guapé não foi contemplada pelo turismo resultante da criação de represa na década de 50, porque ela foi pro fundo quase que completamente. A cidade de Capitólio, em frente a Guapé, assumiu o papel de polo turístico da região, por ter acesso mais fácil e por estar mais perto dos famosos Cânions que foram formados com a represa.

Dessa forma minha Filha aguardava a visita dos parentes e amigos enquanto criava meus dois netos com uma qualidade de vida só encontrada em cidades dessas dimensões e situação: sua casa é bem na frente da represa, a uns 10 metros da água quando a represa está cheia.

Casa da minha Filha em Guapé

Foi quando levei pra visitar Guapé uma grande amiga dela, por coincidência mãe de uma grande amigo meu (reparem aqui os sinais trocados), que decidi levar adiante uma ideia quase impossível de realizar: levar para Guapé uma legião de 50 pessoas para juntos comemorarmos os meus 70 anos de idade. Na verdade o aniversário era um pretexto para fazer meus amigos conhecerem Guapé, como também para alegrar a vida da minha filha com a visita dos meus amigos.

Minha filha Australiana, com seu marido e um dos seus filhos, estaria no Brasil na segunda quinzena de setembro. Havia ainda os 65 anos do meu irmão, os 60 do meu outro irmão. Enfim, mãos à obra.

Guapé tem uma população de 17.000 habitantes, logo, levar 50 pessoas pra lá corresponderia a levar 4.000 pessoas para Campinas. Em termos, porque Guapé tem uma pousada maravilhosa, a Pousada do Lago, com 22 apartamentos com ar condicionado, para onde nos deslocamos. Veio gente de Melbourne (3), Brasília (3), Goiânia (3), Florianópolis (3), Vitória (2), Belo Horizonte (3), Rio de Janeiro (2), São Paulo (3), Jundiaí (2) e Campinas (24), que junto com a família da Minha Filha em Guapé perfizeram 52 pessoas.

Todas chegaram a Guapé no dia 27/09, sexta feira, sem transtornos. Os de Florianópolis pegaram a Azul pra Campinas e daqui seguiram em um carro meu. Os de Vitória voaram até BH e alugaram carro. Os restantes dirigiram de suas cidades. Minha Filha Australiana seguiu comigo de Campinas.

No sábado 28 havia dois passeios programados: um para os Cânions, umas formações rochosas na represa, e outro para o Paredão, uma cachoeira maravilhosa perto da Pousada.

Canyons de Furnas

Paredão - Guapé

Para os Canyons toma-se uma lancha da Pousada com lugar para seis. Uma hora e pouco de viagem. É bom levar roupa de banho porque o toilete é a represa. Para o Paredão a estrada de 10 km é de terra, mas sem problemas. 

A comida da Pousada era "mineira de primeira". Teve de tudo: costela no bafo, churrasco, feijão tropeiro, frango caipira, peixe, etc. Diária completa do casal de R$ 280. Na tarde de sábado começou o agito. Eu pertenço a um grupo de pretensos sambistas em Campinas, o qual acaba de comemorar 35 anos. Teve samba até a hora do jantar, um tremendo churrasco feito pelo Everaldo, o gerente da Pousada. Foi então que a eletricidade resolveu dar um ar de ausência e ficamos no escuro. Um ambiente de velório tomou conta da turma, mas o CachaSamba colocou tudo em ordem fazendo um samba acústico que levantou a platéia. No domingo de manhã boa parte dos presentes voltou para suas cidades, mas muitos resolveram ir apenas na segunda. Foram aqueles que viajaram mais de 800 km e quiseram ficar mais um pouco para aproveitar melhor a viagem longa. 

A mais feliz, é claro, era a minha Filha guapeense. Ela então resolveu distribuir a essa turma toda uma prova da sua alegria, o que se deu através de uma lembrancinha e uma carta que eu tomo a liberdade de reproduzir abaixo:

                                                                      Guapé, MG, 28 de Setembro de 2013.
Queridos,
Precisava aproveitar este evento para dizer a vocês que, neste final de semana, compreendi muito sobre a vida. Foi uma linda lição. Obrigada por isso.

Precisava dizer que fiquei envaidecida e orgulhosa do amor que todos vocês tem pelo meu pai. Reunir pessoas tão especiais, que dedicaram tempo, esforço e dinheiro para se doarem a um projeto desta dimensão, é a prova de que o cara é mesmo incrível. 
E ele é.
Sempre soube disso, claro, mas achei que era coisa minha, coisa de filha que teve a sorte de ser criada por um homem absurdamente bom, generoso e correto. Mas hoje vejo que não sou a única a enxergar o meu pai como um exemplo de amigo. Que bom! Sinal que ele soube plantar bem as suas sementes no decorrer destes 70 anos de vida. Fico feliz em saber que o meu pai será sempre bem falado por aqueles que realmente o conheceram e que eu não estarei sozinha quando, num futuro (distante!), lembrar dele com saudade.
Mas também preciso contar que, olhando o rosto de cada um de vocês durante estes poucos dias, fui tomada por uma ternura ímpar. Memórias lindas e especiais surgiram de todos os lados, me dando conta da importância que cada um de vocês tiveram na nossa vida familiar.
Neste final de semana percebi que as amizades dos meus pais, indiretamente, também formaram o meu pilar afetivo e a certeza de que o mundo é bom e que o futuro é garantido. Para um criança é importante saber que, na falta dos pais, há retaguarda.
E essa certeza eu sempre tive.
Graças às boas amizades dos meus pais, cresci cercada por adultos que me garantiram amor e carinho. Fui criada não apenas por um pai e uma mãe, mas por uma rede de pessoas que me ampararam incondicionalmente e isso, tenho certeza, fez de mim um adulto mais seguro.
Obrigada a cada uma de vocês por este privilégio.
Hoje percebo que a coisa é tão linda e forte que agora meus filhos estão contaminados pela tal rede. Nunca vi os meus dois meninos tão felizes. Crianças pequenas não costumam ter tanto interesse por adultos, mas eles, no decorrer desta festa, vibraram com cada convidado porque tiveram a certeza que estavam diante de algo maior. Aprenderam que as amizades podem, sim, ser tão importantes quanto a família, e que não há nada de errado em se confiar nisso.
E os dois devem ao avô esta lição. Hoje sei que esse foi o maior legado deixado pelo, agora velho, Fontenelle.
Por fim devo dizer que fiquei feliz com a visita de cada um de vocês à minha casa. Nunca compreendi a razão do meu pai marcar este encontro num lugar não distante, mas devo confessar que adorei a oportunidade de, de lambuja, receber visitas queridas. O meu lar agradece as boas energias deixadas por aqui.
Obrigada pela presença, um beijo grande e bom retorno. Para a casa de vocês. E para Guapé...um dia.

Ao ler este post tudo vai ficar claro para ela. Ela vai entender porque eu marquei esse encontro em Guapé. Foi para mostrar aos meus amigos a pessoa maravilhosa que ela é, que consegue ver no seu velho Pai cheio de defeitos uma pessoa "incrível".  

Nos setenta anos de minha vida eu tive algumas vitórias. Em 1969 eu encontrei a companheira certa, com a qual passei os últimos 44 anos num enorme esforço de me tornar digno da joia que eu encontrei; essa com certeza foi a maior das vitórias. Outras duas foi ter tido duas filhas que me deram a certeza da eternidade. Aquela que vai completar o rol das minhas necessidades para uma velhice feliz foi ter encontrado, nessa estrada longa que já percorri, mas que é pequena se comparada por exemplo àquela percorrida pelo meu Pai, um grupo de amigos do naipe mostrado na foto abaixo:


Encontro em Guapé, 28/10

                  



Comentários

  1. Meu caro tio Otávio,

    O final de semana em Guapé foi maravilhoso. Um grande encontro de pessoas muito especiais, para homenagear alguém realmente incrível. Concordo com a Cláudia. Adoramos a oportunidade de estar ali com o senhor e sua família tão querida, num momento tão especial, bem como rever grandes amigos de longa data, e conhecer outros novos.

    O show do Cacha-samba foi sensacional! A queda da energia não estragou nada a festa. Pelo contrário, deu um toque de charme com as luzes de velas, e aproximou ainda mais as pessoas, nos remetendo ao clima das fazendas de antigamente, onde a iluminação ficava a cargo dos lampiões, lamparinas e velas, e mais uma vez, o Cacha-samba arrasou com seu show acústico.

    Por fim, na despedida de Domingo, ler aquela carta da Cláudia foi de encher o peito e tirar lágrima dos olhos. Voltamos com a sensação de que realmente foi muito bom ter estado ali. Aquele final de semana entrou para a história.

    E o carro, estava inteiro? Obrigado pelo gentileza de nos ter emprestado!

    Um forte abraço,

    Luciano, Ana Paula e Guilherme.

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  2. Caro amigo / sobrinho postiço. O carro estava como foi entregue a você. Grato pela sua presença e de sua família. Um grande abraço.

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  3. Antes tarde do que nunca: sua festa foi M-A-R-A-V-I-L-H-O-S-A!
    Fiquei muito feliz em ter sido considerado apto a integrar seu grupo de amigos realmente precioso.

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    Respostas
    1. Acho que, por razões que nós dois sabemos, a sua presença foi das mais importantes. Talvez a que exigiu mais desprendimento para realizar essa Via Crucis. Por essas e por outras que eu me considero um felizardo, por ter amigos do seu quilate.

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