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Os Nossos Ridículos Tiranos

Em 2013 travei conhecimento com Moisés Naím, um venezuelano que foi Ministro do Desenvolvimento do seu País, foi diretor executivo do Banco Mundial e editor chefe da revista Foreign Policy. Tratava-se do livro O Fim do Poder, em que o autor faz uma análise das mudanças que estavam ocorrendo nas salas de diretoria, nos campos de batalha, nas Igrejas, nos Estados, relativamente às forças que resultam no exercício do Poder. 

Moisés Naím é hoje um dos colunistas do Estadão que eu nunca deixo de acompanhar, e a sua crônica dessa segunda feita 15 de outubro, "Raiz Comum de AMLO e Bolso", foi a gota d'água que faltava para me tornar mais pessimista com relação ao segundo turno de nossas eleições. 

AMLO é Andrés Manuel López Obrador, o já eleito futuro presidente do México. Bolso é o nosso Bolsonaro, o mais que provável futuro presidente do Brasil. Estamos falando aqui dos dois maiores países do nosso continente Latino Americano, o Brasil com um PIB de 2 trilhões de dólares e o México com 1,4 trilhões; o Brasil com 210 milhões de habitantes e o México com 130 milhões. Enfim, estamos falando de mais de metade tanto do PIB quanto da população desse nosso pobre continente. 

AMLO é um populista de esquerda, Bolso é um populista de direita. Ambos chegarão ao poder com um suporte político que, para tornar realidade o que deles se espera, não falta nada e ao mesmo tempo falta tudo. 

As origens dessas duas figuras, as suas carreiras políticas, são radicalmente opostas. O mexicano bate de frente com o empresariado enquanto o brasileiro se diz liberal. Obrador fala em anistia ao mesmo tempo em que Bolsonaro declara guerra ao crime. Um namora os sindicatos, o outro flerta com os militares. Bolsonaro levanta bandeiras que resultam em uma adesão em massa de todas as forças da intolerância. Aqui se cria uma enorme confusão na cabeça do eleitor brasileiro, que a meu ver liga as concepções da esquerda aos posicionamentos da sociedade referentes ao aborto, ao casamento entre pessoas do mesmo sexo, e por aí vai. Tanto isso é verdade que o mexicano prefere passar ao largo deses temas, alegando que tudo deve ser resolvido mediante consulta direta ao povo. 

Com referência ao nosso vizinho maior as diferenças se acentuam. Bolsonaro detesta Maduro e admira Trump. Já Obrador, dada a forma "amistosa" com que Trump trata os mexicanos, é cauteloso na relação com os americanos e é omisso em relação à Venezuela. Para ele a crise da Venezuela é assunto interno que não merece uma intervenção externa. 

Fica difícil então encontrar semelhanças entre essas duas figuras. Mas elas existem e são talvez mais interessantes que as diferenças. Na verdade ambos são o produto resultante de uma tendência global que leva as sociedades a romper com a política tradicional. Para chegar a esse nível de representatividade perante o eleitor torna-se necessária uma espécie de cirurgia plástica nos seus perfis. Já que o objetivo é se apresentar como "outsider", marginalizado pelas cúpulas, suas imagens são talhadas de forma a levar o eleitor a crer que eles nada têm a ver com o sistema vigente. Nos dois casos em questão isso obviamente não é verdade, já que a trajetória política de ambos é longa. 

Obrador desde muito jovem militou no PRI, o Partido da Revolução Institucional. Foi prefeito da Cidade do México e candidato a presidente nas últimas três eleições. Já Bolsonaro é deputado federal há quase 30 anos. Logo, não é verdade dizer que eles são candidatos antissistema, mas se isso não for disseminado eles não ganham as eleições. Essa é a tendência mundial. É necessário convencer o eleitor de que o candidato repudia o estado de coisas vigente, mesmo em se tratando de velhas raposas da área. Para isso vestem-se máscaras de "novo" nos candidatos, de pessoas sem qualquer culpa pelos males dos quais os eleitores estão fartos. 

Essa postura aproxima AMLO e Bolso. Um pela direita, outro pela esquerda, a ideia é convencer o eleitor que eles possuem o perfil que o eleitor procura. Ao mesmo tempo ambos trazem consigo um perigo, que é uma forte antipatia com relação às práticas que limitam o poder do Executivo. Segundo Naím, ao ganharem as eleições esses candidatos demonstram uma tendência a:
  • Limitar a independência do Congresso
  • Encher o judiciário de juízes "amigos"
  • Atacar os meios de comunicação críticos ao governo
  • Criar fontes alternativas de comunicação afinadas com o presidente
Essas características deixaram de ser prerrogativas de republiquetas. Esse cardápio infelizmente é hoje parte integrante se sistemas de governo que vão desde os Estados Unidos, até a Hungria, a Turquia e a Tailândia. A rigor ninguém escapa dessa tendência e aqui podemos incluir as democracias da Europa Ocidental. No que nos diz respeito à nossa América Católica, tanto AMLO quanto Bolso agem e dizem coisas que os aproximam desse novo perfil de político. 

É claro que, em última análise, não vale culpar o torcedor pelas mazelas que o time de políticos vem praticando há décadas em nosso pobre continente. O enfraquecimento dos pesos e contrapesos que limitam o poder executivo é culpa exclusiva dos que fizeram uso do poder que lhes foi outorgado para outros fins, e a democracia é quem sofre com esse estado de coisas. 

Mais da metade dos brasileiros hoje acredita que um governo não democrático poderia resolver essa situação, e o mesmo acontece com o México. A receita para o sucesso é a procura do "homem forte", necessariamente "novo", que lute contra a corrupção e o crime e tranquilize a população já cansada dos altos níveis de violência. Se oferecer como o Messias é muito mais atraente que defender as instituições que limitam o poder executivo e protegem o cidadão. Nesses quesitos AMLO e Bolso estão na mesma página. 

Nós brasileiros em particular temos uma herança "sebastianista" da qual dificilmente algum dia nos livraremos. Um Rei português é derrotado em uma batalha no Norte da África e seu corpo nunca é encontrado. Surgiu então a crença de que Don Sebastião iria voltar para salvar o Reino dos problemas desencadeados com o seu desaparecimento.

Esse é o nosso destino decorrente de nossa herança lusitana. Nossa história está repleta de "Sebastiãos", e essa tendência é decorrente do fato reconhecido de que somos um povo "cordial". Nossa visão social tem um alcance limitado àqueles que estão mais próximos de nós, e como o nosso círculo de relações não é grande a solução é encontrar alguém acima de nós para resolver nossos problemas. 

É aí que surgem os Collors, os Lulas, os Bolsonaros. No caso em curso o eleitor brasileiro se vê numa situação que eu comparei com a daquela pessoa do topo do Edifício Andraus, que teve que escolher entre ser queimada pelo fogo que subia ou se jogar lá de cima. Ficar lhe dá a certeza de que morrerá queimada pelo vermelho do PT; se jogar para ela é um pulo no desconhecido. Quem sabe não haverá lá em baixo uma rede esperando por ela...

Da minha parte eu escolhi me jogar. Eu e quase todo o País. vamos ver no que dá.

Comentários

  1. Não ha´como fazer nenhuma comparação hoje,entre um agitador de porta de fabrica,incompetente,desonesto, semi-analfabeto e seguidor de regimes e sistemas fracassados e comprovados com base em Lenin,KMarx,Che Guevara,Chaves,Fidel Castro etc.como e´o bandido Lula com o Sr.Jair Bolsonaro que detem o maior atributo de um homem que e a dignidade e uma formação adequada e superior ao condenado;

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    1. Caro Adelson
      Aqui ninguém falou do Lula. O que o Moisés Naim fez foi uma comparação entre o presidente do México e o futuro presidente do Brasil, que eu repliquei nesse Post e, a meu modo, comentei.
      Se você confundiu o López Obrador com o Lula você acertou, já que os dois são farinha do mesmo saco. Só que o seu ídolo Bolsonaro está em outro saco, á direita do anterior, que está recebendo votos anti PT, o que quase todos nós, eu inclusive, vamos fazer. A má sorte me obriga a votar contra e não a favor.

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    2. Caro Luiz Fontenelle, não e´meu idolo o Sr.Bolsonaro,porem a escoria dos politicos e da sociedade brasileira em sua maioria, transformaram o Brasil numa nação de ultima categoria, o meu voto não e´de protesto e sim conciente,incomparavel ao adversario serviçal de bandido e pertencente a uma quadrilha imensa.Somos um povo subdesenvolvido e não vejo em que podemos nos orgulhar.Para mim, o ideal seria uma intervenção Militar para jogar esta Constituição no lixo,neutralizar todos os canalhas dos poderes constituidos e buscar uma Constituição nos moldes de Nações exemplares como Noruega,Dinamarca,Nova Zelandia etc. porque aqui não temos competencia e isenção para construir uma Nação decente para todos e principalmente quanto ao futuro de nossos filhos e netos.....

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    3. Caro Adelson
      Acho que estamos quase na mesma página. Eu vou votar 17 com a finalidade exclusiva de evitar o 13. Você vai votar para evitar o 13 e tem expectativas com relação ao 17.
      Tudo bem. Faz parte de nossas naturezas. Diz a teoria da evolução que o pessimista sofre menos com a surpresa positiva. Só isso.
      Quanto a moldar uma constituição com base na de países com menos de 5% da população do nosso Brasil e uma formação não católica, aí eu já acho que é otimismo demais. Fomos colonizados por um povo que até hoje espera pelo Rei Sebastião.

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    4. Caro Fontenelle,respeito sua postura diante desta triste situação brasileira.Penso que precisamos formar uma outra sociedade com base numa Constituição com Obrigações e Direitos para todos e não a que esta´em vigor elaborada por Constituintes politicos, desonestos e incapazes....

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  2. Comparar AMLO um estadista cada dia mais respeitado no pais e fora dele com um histórico de realizações politicas e intelectuais com um deputadozinho do baixo clero do "Congresso" porta voz de ideais caipiras tragicomicos... Deus nos perdoe. Tem o seguinte meus amigos, viveram 13 anos confortavelmente no ultimo andar do Joelma sob fogo e nunca ninguem pensou em se jogar na escuridão da ignorancia e do fascismo. Agora virou moda ... Deus nos perdoe novamente.

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    1. Caro Amaro
      Sei que é difícil para uma pessoa de esquerda entender que na esquerda também existem oportunistas. Eles estão sempre certos e ainda não entenderam o buraco em que nos metemos com 4 mandatos de um partido que não fez mais que trabalhar no sentido de se perpetuar no poder, custasse o que custasse.
      Um dia você vai entender isso: quase ninguém está votando no Bolsonaro; quase todos estão votando contra o PT. O Bolsonaro não é mais que um subproduto da aversão ao Lula, o nosso Obrador.

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  3. A verdade é que o a Economia vai recuperar independente de qual palhaço subir ao picadeiro. Gloria a Deush! O problema é o circo pegar fogo sem necessidade, que é o que está ocorrendo.

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  4. A Eleição da Cidade do México ocorrida em Julho, vencida pelo Velho Politico AMLO, já era "carta marcada", pela simples razão da sua ligação com o Bilionário Carlos Slim, maior fortuna do mundo, que dá as cartas na politica.
    Quem está bancando o Candidato Bolsonaro, se tiver com que interesse?

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  5. Voltando do hospital, rebato alguns comentários, normalmente não o faria , mas este é um momento importante. Sr. João estude o Instituto Millenium fundado pelo Paulo Guedes. Terás uma idéia de onde surgiu o "mito". Segundo ponto: Carlos Slim é um empresário Mexicano um orgulho para a nação. Seria mal comparado um Antonio Ermirio de Morais ou um Coronel Osiris,heróis da nossa nacionalidade entre tantos outros, mais que tudo forças que impulsionam um país. Veja que AMLO representa os grandes interesses hoje, dos interesses economicos Mexicanos e isto e bom para todos lá. Quem vai negociar nossos interesses no palco áspero do comércio internacional, quem vai dar as cartas?

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  6. portanto Bolsonaro representa os mercados financeiros, o setor bancário etc. que há décadas vem recebendo mais da metade de toda a arrecadação do estado. Com gordíssimos lucros nestas operações como todos sabem. O programa do PG visa reduzir este risco, cada vez mais preente, mantendo o fluxo de caixa das instituições beneficiárias deste sistema. No entanto isto não vai ser tranquilo. Mesmo as forças de direita tem suas divergências. Vamos ver, como diria o cego.

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