Pular para o conteúdo principal

Sobre o Uruguai

Hoje vou fazer uma homenagem a um país vizinho que me surpreende a cada dia. Minha presença no Uruguai decorre de uma visita que fiz na década passada, a serviço da empresa na qual trabalhava. A visita durou apenas 3 dias e ficou restrita a Montevidéu. Mesmo assim a impressão que tive foi a de uma cidade bela, limpa, e com uma excelente gastronomia (para mim uma condição essencial).

O que me leva a falar do Uruguai é um relatório da "The Economist", "Democracy Index 2015", que afirma que, fora os países ricos da Europa Ocidental, a América do Norte e da Oceania, apenas o Uruguai e as Ilhas Maurício (um pequeno arquipélago a leste de Madagascar) podem ser considerados democracias plenas. Para dar uma ideia da importância dessa afirmação, basta ver que Japão e Coreia do Sul não são considerados democracias plenas.

Além de colocar o Uruguai entre as maiores democracias do globo, "The Economist" já o havia eleito o pais do ano em 2013, em grande parte pela pioneira legalização da maconha. Segunda a revista, "as conquistas mais dignas de menção são, acreditamos, aquelas reformas inovadoras que não se limitam apenas a melhorar um país, mas que, se imitadas, poderiam beneficiar o mundo". A legalização e a regularização da venda e do consumo da maconha "é uma mudança tão claramente razoável que encurrala os criminosos e permite às autoridades concentrar-se em delitos mais graves; se outros (países) a seguissem, se fossem incluídas outras substâncias, o dano que estas drogas causam seria drasticamente reduzido".

Há anos a revista defende uma mudança nas políticas de combate às drogas baseadas na repressão, por considerar que elas fracassaram. Mas ela chama a atenção para o fato de que o Uruguai também legalizou o casamento gay em 2013, uma reforma que "aumentou a quantia mundial de felicidade humana sem qualquer custo financeiro".

Para essas coisas ocorrerem torna-se necessária a presença do Estadista, e a revista derrama elogios a José Mugica, o presidente da época, por sua "franqueza incomum para um político", por seu estilo de vida austero, vivendo em uma casa modesta, dirigindo um Fusca, e voando na classe econômica.

"Modesto, mas corajoso, liberal e amante da diversão, o Uruguai é o país do ano. Felicitações", disse a revista. Mas isso não é tudo a respeito desse grande homem. Vejam o discurso que ele fez na ONU e tirem suas conclusões:

http://zh.clicrbs.com.br/rs/noticias/noticia/2013/09/leia-a-integra-do-discurso-de-jose-mujica-na-onu-4281650.html

Espero que tenham se dado ao trabalho de lê-lo, porque foi considerado por muitos o melhor discurso já realizado em uma Assembléia da ONU. Mas não é só isso; quando Obama se viu na enrascada de ter que desovar em algum lugar 5 prisioneiros de Guatánamo, apenas o Uruguai de dignou a recebê-los:

http://www.redebrasilatual.com.br/mundo/2014/03/mujica-aceita-receber-no-uruguai-prisioneiros-de-guantanamo-a-pedido-de-obama-3572.html

Nunca entendi muito bem como o Uruguai sobreviveu à presença de dois vizinhos enormes, um ao norte e outro ao sul e oeste. A explicação me foi dada pelo nosso representante comercial em Montevidéu: O Uruguai, bem como o Equador, são invenções do Império Inglês, que queria portos no Atlântico e no Pacífico Sul que não pertencessem ao Brasil, à Argentina, ao Chile, ao Peru e à Colômbia (Mujica em seu discurso menciona isso). A experiência deu tão certo que foi replicada na Europa continental, com a invenção da Bélgica, também uma cria inglesa.

O resultado disso é que temos no Rio da Prata um país com 176 mil quilômetros quadrados (62% do Rio Grande do Sul, seu vizinho) e população de 3,3 milhões de habitantes (base 2008, 29% da do Rio Grande do Sul). Montevidéu concentra 1,3 milhões de habitantes, mais ou menos uma Goiânia, mas além da capital apenas Canelones, vizinha a Montevidéu, com 480 mil habitantes, tem uma população significativa.

A cidade de Santana do Livramento, no Rio Grande do Sul, é separada da cidade de Rivera, no Uruguai, por algumas ruas: Um lado dessas ruas pertence a um país, outro lado pertence a outro país. Um país tem a população setenta vezes maior que a do outro. mas a revista em questão se esmera em promover o país menor. O Cristo Redentor que decolava na sua capa anos atrás entrou em parafuso e agora tapa os ouvidos e os olhos para não ter que ouvir e ver tanta barbaridade. Pena.




Comentários

  1. Pepe Mujica um herói desesperado tentando mostrar um caminho que não vai ser trilhado. Stephens Hawkings pode ter razão em que a humanidade caminha para o suicídio coletivo. Ele, Mujica, tentou. Deixou um exemplo de vida como legado, e um país amigo para os negócios com sistema fiscal atrativo,muitos empresários brasileiros mudaram para lá. Mas o Uruguay é o que é porque lutou muito por ideais libertários e democráticos, lutou não apenas em discursos bombásticos, mas com o sangue literalmente de seu povo, dos seguidores de Aparício, dos Montoneros e outros. Talvez a única saída seja esta de estimular a vergonha na cara dos atores futuros, outras gerações que a nossa parece que já era. Pepe Mujica pode ser um bom exemplo para a sala de aula de nossos netos. Temos de propagar sua história.

    ResponderExcluir
  2. Caro Amaro. Agora percebo que eu devia ter pedido a você para escrever sobre o Uruguai e o Pepe. Por suas raízes, por seu conhecimento da história e da região. Mas o que me alegra é que você sempre tem um comentário sobre o que escravo, e eles são sempre pertinentes.

    ResponderExcluir
    Respostas
    1. A tempo de corrigir no Uruguay foram os Tupamaros, os Montoneros eram argentinos, embora muito conectados. O Mujica fazia parte deste grupo liderado pelo Raul Sendic que pregava um tipo de vida pessoal austera combinado com uma guerrilha mais política que violenta anti ditaduras ao norte e sul e tratando de manter o Uruguay independente com um caminho utópico (e ingênuo) para o socialismo.

      Excluir

Postar um comentário

Postagens mais visitadas deste blog

A Europa Islâmica

É irreversível. A Europa, o berço da Civilização Ocidental, como a conhecemos, está com seus dias contados. Os netos dos nossos netos irão viver em um mundo, se ele ainda existir, no qual toda a Europa será dominada pelo Islamismo. Toda essa mudança se dará em função da diminuição da população nativa. Haverá revoltas localizadas, mas o agente maior dessa mudança responde por um nome que os sociólogos têm usado para alertar para esse desfecho: a Demografia. Vamos iniciar este Post com um exercício simples. Suponhamos uma comunidade de 10.000 pessoas, 5.000 homens e 5.000 mulheres, vivendo de forma isolada. Desse total metade (2.500 homens e 2.500 mulheres) já cumpriu sua função procriadora, e a outra metade a está cumprindo ou vai cumprir. Aqui vamos definir dois grupos, o velho não procriador e o novo procriador. Se os 2.500 casais procriadores atingirem uma meta de cada um ter e criar 2 filhos, teremos como resultado que, quando esta geração envelhecer (se tornar não procriadora), a c

Sobre os Políticos

Há tempos estou à procura de uma fonte que me desse conteúdo a respeito desse personagem tão importante para as nossas vidas, mas que tudo indica estar cada vez mais distanciado de nós. Finalmente encontrei um local que me forneceu as opiniões que abasteceram a minha limitada profundidade no assunto: Uma entrevista no site Persuation, de Yascha Mounk, com o escritor, diplomata e político Rory Stewart.  Ex-secretário de Estado para o Desenvolvimento Internacional no Reino Unido, Rory Stewart é hoje presidente de uma instituição de caridade global de alívio à pobreza, a GiveDirectly (DêDiretamente em tradução Livre) e autor do recente livro How not to be a Politician, a Memoir (algo como "Como não ser um Político, um livro de Memórias"). A entrevista é longa e eu me impressionei com ela a ponto de me atrever a fazer um resumo. Pelo que entendi, com o livro Stewart faz uma descrição de suas experiências na política do Reino Unido. Ele inicia a entrevista falando da brutalidade

Civilidade e Grosseria

  Vamos iniciar este Post tentando ensaiar teatrinhos em dois países diferentes: País A O sonho do jovem G era ser membro da Força Aérea de A, mas na sua cabeça havia um impedimento: ele era Gay. Mesmo assim ele tomou a decisão de apostar na realização do seu sonho. O País A  não pratica a conscrição, ou seja, ninguém é convocado para prestar serviço militar. Ele está disponível para homens entre 17 e 45 anos de idade. G tinha 22 e entendeu que o curso superior que estava fazendo seria de utilidade na carreira militar. Detalhe: há décadas o País A tinha tomado a decisão de colocar todos os ramos militares em um único quartel, com a finalidade de aumentar o grau de integração e a logística. Isso significa a Força Aérea de A está plenamente integrada nas Forças de Defesa de A. Tudo pronto, entrevista marcada, o jovem G comparece à unidade de alistamento e é recebido com a mesma delicadeza que aquele empresário teria ao se interessar por um jovem promissor de 22 anos. Tudo acertado, surgi