Pular para o conteúdo principal

Felicidade: a Oficial, a Subjetiva e a Objetiva

Uma pesquisa internacional para medir a perspectiva de felicidade da população em 132 países, elaborada em 09/2008 pela FGV, mostrou que o brasileiro é o povo mais confiante em como estará a sua situação dali a cinco anos. Numa escala de 0 a 10, o grau de felicidade futura do povo brasileiro atinge 8,78, à frente da Venezuela (?) com 8,52 e da Dinamarca com 8,51. Na ponta inferior ficaram  Zimbábue (4,04), Cambodja (4,86) e Paraguai (5,04). Essa fantástica visão otimista foi atribuída principalmente a dois fatores: o aumento da renda do trabalho do jovem entre 2004 e 2008 (10,5%) e o aumento dos anos de estudo (9,7 em 2004 contra 10,4 em 2008). Segundo a FGV, o questionário foi aplicado pelo Instituto Gallup a 150 mil pessoas dos 132 países, e ela trabalhou os dados da pesquisa para chegar a esses resultados.

Temos aqui um exemplo de avaliação oficial da felicidade do brasileiro. Tomam-se dois parâmetros como importantes, aumento de renda e aumento dos anos de estudo, e através de uma matemática amigável chegamos ao que queremos, que é nos colocar em primeiro lugar entre os povos de maior expectativa de felicidade. A prova maior da distorção a que se chega é o fato de a Venezuela estar em segundo lugar, e causa espanto termos a Dinamarca em terceiro, já que nem a renda nem os anos de estudo devem ter crescido por lá nesses 4 anos.

Acontece que, subjetivamente, não há como negar que de fato somos um povo, se não feliz, ao menos muito otimista. Tom Jobim deu a sua contribuição com uma frase que é recorrente em toda conversa de bar. Perguntado sobre qual a diferença entre o Rio e Nova York, onde passava o verão, disse que "lá tudo é muito bom, mas é uma merda, e que aqui tudo é uma merda, mas é muito bom". Em outras palavras, nos acostumamos a tirar leite de pedra, e a nossa resiliência nos faz felizes qualquer que seja a adversidade. Zeca Pagodinho, não à toa, é o atual rei do otimismo, e suas músicas são talvez a maior contribuição que o brasileiro recebe para enfrentar o seu dia a dia sofrido:
  • "Eu envergo mas não quebro, amanhã vai melhorar....tá ruim mas tá bom eu tenho fé, que a vida vai melhorar"
  • "Deixa a vida me levar, vida leva eu, sou feliz e agradeço por tudo o que Deus me deu...se não tenho tudo  o que preciso, com o que tenho vivo e de mansinho lá vou eu"
Já do ponto de vista da objetividade, só podemos medir se uma sociedade é feliz se ela se mostra satisfeita com as ferramentas à sua disposição para o suprimento das suas necessidades, sejam elas básicas ou de auto realização. Negar isso é cair na vala comum da retribuição das nossas agruras com a promessa de uma vida cheia de recompensas após a morte. Os islamitas falam até de 72 virgens à nossa disposição no reino dos céus, o que os torna felizes aqui, a ponto de se matarem em nome de Alá.

A Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE) realiza uma pesquisa anual para medir a felicidade dos seus países membros com base em onze parâmetros. A Austrália tirou o primeiro lugar este ano, pela terceira vez consecutiva, enquanto o nosso Brasil ficou em um honroso 33° lugar entre 36 países analisados, com o consolo de termos ganho uma posição, já que em 2012 fomos 34°.

Os 10 primeiros colocados foram Austrália, Suécia, Canadá, Noruega, Suíça, EUA, Dinamarca, Holanda, Islândia e Grã Bretanha. Atrás do Brasil ficaram Chile, Turquia e México.

Vamos então fazer uma análise comparativa entre as notas atribuídas à Austrália e ao Brasil nos onze itens avaliados, juntamente com comentários, quando existentes, referentes às notas do Brasil:
  • Habitação: 7,5 x 3,9 - Sem comentários
  • Renda: 4,5 x 0,0 - Menor que a média de US$ 23 mil por ano dos países da OCDE
  • Emprego: 7,6 x 4,6 - Mais de 68% das pessoas entre 15 e 64 anos têm emprego, maior que a média de 66% da OCDE, mas uma parcela maior cumpre jornadas muito longas
  • Comunidade: 8,3 x 6,1 - 88% dos brasileiros conhecem alguém em quem se apoiar em caso de necessidade
  • Educação: 7,6 x 1,4 - 41% dos brasileiros têm diploma de ensino médio, menor que a média de 74% da OCDE
  • Meio Ambiente: 8,7 x 6,5 - Níveis de poluição são próximos, mas mais brasileiros reclamam da qualidade da água que os cidadãos da OCDE
  • Engajamento Cívico: 9,3 x 4,4 - Vota-se mais no Brasil (79%) que nos países da OCDE (72%). Pudera; o voto aqui é obrigatório (comentário meu). 
  • Saúde: 9,3 x 4,7 - Expectativa de vida brasileira, de 74 anos, é menor que os 80 anos da OCDE
  • Satisfação com a Vida: 8,1 x 6,3 - Brasileiros são levemente mais satisfeitos (82% contra 80% dos países da OCDE)
  • Segurança: 9,5 x 2,7 - Sem comentários
  • Equilíbrio Vida Pessoal x Vida Profissional: 6,5 x 7,2 - Sem comentários.  
Da minha parte o que chamou a atenção foram aquelas notas em que perdemos de lavada: Renda (4,5 x 0), Educação ((7,6 x 1,4) e Segurança (9,5 x 2,7), bem como aquela em que conseguimos ganhar da campeã: Equilíbrio Vida Pessoal x Vida Profissional (6,5 x 7,2). Entrei no site http://www.oecdbetterlifeindex.org/#/11111111111, na página referente ao Brasil, e constatei o seguinte:
  • Renda: A renda média líquida dos brasileiros é de US$  5.861, enquanto a média dos 36 países analisados foi de US$ 23.047. Isso nos colocou em último lugar. Também ficamos em ultimo lugar em outro parâmetro que definiu a nossa nota zero, que é a riqueza financeira das famílias. A nossa riqueza familiar média é de US$ 10.225 contra a média de US$ 40.516. A conclusão foi que, embora o dinheiro não compre felicidade, ele é um meio importante de se alcançar um padrão de vida melhor, e de melhorar o acesso à educação de qualidade, à saúde e à moradia.
  • Educação: O brasileiro estuda em média 16,3 anos (base 2013), o que nos coloca em 31° lugar. Em outro parâmetro, que mede a qualidade da Educação, fomos colocados de novo em último lugar, com a agravante de termos uma desigualdade social enorme, espelhada fielmente na Educação. A eficiência da Educação, que seria o proveito resultante do fato de termos nos educado, nos colocou em 33° lugar, mas com uma expectativa positiva (?).
  • Segurança: A nossa taxa de homicídios por 100.00 habitantes é de 21,0 (35° lugar), quase 10 vezes a taxa da OCDE que é de 2,2. E o que é pior: 39,0 para homens contra 3,8 para mulheres. No Brasil 7,9% das pessoas declararam terem sido assaltadas, o que nos colocou em 34° lugar nesse quesito.
  • Equilíbrio Vida x Trabalho: Aqui os critérios acabaram por nos beneficiar, porque na realidade os australianos trabalham mais que nós. Tenho uma filha que mora em Melbourne há 12 anos e sei o que estou falando: as férias são mais curtas o que diminui o tempo dedicado ao lazer e aos cuidados pessoais (fomos os 16°s colocados enquanto os australianos foram os 25°s). Os australianos que trabalham mais de 50 horas por semana são 14,3% (30° lugar) contra 12,% dos brasileiros (27° lugar). Minha conclusão foi a de que os brasileiros têm mais tempo pra ver novela, já que não há renda para se fazer outra coisa; mas tudo bem, é um critério.
Tentei mostrar esses dados por várias vezes a amigos meus. O sentimento chauvinista fala mais alto, o que nos coloca na desconfortável situação de concordar com os dados apresentados mas discordar da correlação entre eles e o grau de felicidade (uma coisa é uma coisa, outra coisa é outra coisa). E assim vamos vivendo, empoleirados em condomínios verticais ou cercados em horizontais, caso nossa renda permita.

Um australiano casado com uma brasileira, depois de muita pressão, se mudou para o interior de São Paulo e nos primeiros meses a sua empregada doméstica foi assassinada pelo namorado. A sua primeira providência foi arrumar as malas e retornar pra Austrália. Pena que nós não tenhamos essa escolha. Uma americana, casada com um brasileiro, concordou em passar alguns anos no Brasil, também no interior de São Paulo. Passaram-se os anos e promessa de retornar não foi cumprida. Como dizem os nossos assaltantes, ela perdeu.



Comentários

Postagens mais visitadas deste blog

A Europa Islâmica

É irreversível. A Europa, o berço da Civilização Ocidental, como a conhecemos, está com seus dias contados. Os netos dos nossos netos irão viver em um mundo, se ele ainda existir, no qual toda a Europa será dominada pelo Islamismo. Toda essa mudança se dará em função da diminuição da população nativa. Haverá revoltas localizadas, mas o agente maior dessa mudança responde por um nome que os sociólogos têm usado para alertar para esse desfecho: a Demografia. Vamos iniciar este Post com um exercício simples. Suponhamos uma comunidade de 10.000 pessoas, 5.000 homens e 5.000 mulheres, vivendo de forma isolada. Desse total metade (2.500 homens e 2.500 mulheres) já cumpriu sua função procriadora, e a outra metade a está cumprindo ou vai cumprir. Aqui vamos definir dois grupos, o velho não procriador e o novo procriador. Se os 2.500 casais procriadores atingirem uma meta de cada um ter e criar 2 filhos, teremos como resultado que, quando esta geração envelhecer (se tornar não procriadora), a c

Sobre os Políticos

Há tempos estou à procura de uma fonte que me desse conteúdo a respeito desse personagem tão importante para as nossas vidas, mas que tudo indica estar cada vez mais distanciado de nós. Finalmente encontrei um local que me forneceu as opiniões que abasteceram a minha limitada profundidade no assunto: Uma entrevista no site Persuation, de Yascha Mounk, com o escritor, diplomata e político Rory Stewart.  Ex-secretário de Estado para o Desenvolvimento Internacional no Reino Unido, Rory Stewart é hoje presidente de uma instituição de caridade global de alívio à pobreza, a GiveDirectly (DêDiretamente em tradução Livre) e autor do recente livro How not to be a Politician, a Memoir (algo como "Como não ser um Político, um livro de Memórias"). A entrevista é longa e eu me impressionei com ela a ponto de me atrever a fazer um resumo. Pelo que entendi, com o livro Stewart faz uma descrição de suas experiências na política do Reino Unido. Ele inicia a entrevista falando da brutalidade

Civilidade e Grosseria

  Vamos iniciar este Post tentando ensaiar teatrinhos em dois países diferentes: País A O sonho do jovem G era ser membro da Força Aérea de A, mas na sua cabeça havia um impedimento: ele era Gay. Mesmo assim ele tomou a decisão de apostar na realização do seu sonho. O País A  não pratica a conscrição, ou seja, ninguém é convocado para prestar serviço militar. Ele está disponível para homens entre 17 e 45 anos de idade. G tinha 22 e entendeu que o curso superior que estava fazendo seria de utilidade na carreira militar. Detalhe: há décadas o País A tinha tomado a decisão de colocar todos os ramos militares em um único quartel, com a finalidade de aumentar o grau de integração e a logística. Isso significa a Força Aérea de A está plenamente integrada nas Forças de Defesa de A. Tudo pronto, entrevista marcada, o jovem G comparece à unidade de alistamento e é recebido com a mesma delicadeza que aquele empresário teria ao se interessar por um jovem promissor de 22 anos. Tudo acertado, surgi