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Sobre o Clamor das Ruas

Hoje finalmente vou criar coragem para tentar pôr no papel (?) as conclusões a que cheguei sobre os acontecimentos com os quais a mídia nos tem brindado diariamente e que, felizmente ou não, parece que estão entrando numa curva de estabilidade.

Comecemos pelo conceito de massa. Como se sabe da Física, a massa é uma grandeza escalar, que é definida quando precisamos somente de um valor numérico associado a uma unidade de medida. Exemplo de grandeza escalar seria termos 14.000 participantes em uma manifestação em Brasília, a qual foi convocada por uma única pessoa através de redes sociais, em mensagem encaminhada a apenas 800 destinatários. Não se pode ir além de definirmos um "módulo" para essa grandeza escalar: 14.000 pessoas, da mesma forma como definiríamos 1 quilo de feijão ou 1 litro de gasolina.

Um professor de Física que tive na adolescência costumava dizer que a burrice é, com certeza, uma grandeza escalar. Ela não tem adicionada à sua massa qualquer sentido de direção. Não existe uma forma eficaz de se atribuírem a dois indivíduos limitados em número de neurônios qualquer tipo de orientação que os levem a somar esforços, o que tornaria esses esforços produtivos. No entanto, segundo ele, a inteligência é vetorial, ou seja, existe a possibilidade de dois inteligentes, devidamente orientados, convergirem em uma mesma direção. Existe também a possibilidade de eles divergirem totalmente, o que anularia os seus esforços.

Se tomarmos esse exemplo de duas pessoas e o elevarmos a 14.000, ou 140.000, misturando os burros e os inteligentes, podemos chegar a uma situação cujo controle pode se tornar impossível, e é o que vem ocorrendo de forma sistemática. O que vemos é o fato de que as redes sociais proporcionam uma forma altamente eficaz de arrebanhamento de massas, mas praticamente nada oferecem no sentido de orientar essas massas a convergirem em uma direção comum.

Isso se dá pelo simples fato de que somos uma sociedade despreparada. Esse termo vale inclusive para a nossa "Presidenta". O mesmo cidadão que chegou à conclusão de que Dilma não serve mais para conduzir os nossos destinos como chefe da Nação com certeza vai recorrer ao seu criador Lula, dada a situação de penúria em que se encontram as nossas forças de oposição, que nada conseguiram capitalizar dessa situação. Para darmos uma ideia do ponto em que chegamos basta citar um dado irrefutável: estima-se que o total desviado pela corrupção em todos os níveis do setor público chegue a algo em torno de 70 bilhões de Reais, só que o valor desperdiçado em gastos que má qualidade chega a 440 bilhões de Reais, ou 630 % a mais. Esses 510 bilhões de Reais somados correspondem a 8 vezes o total investido anualmente pelo Governo Federal. Isso permitiria, sem nenhum esforço extraordinário, nenhuma cobrança adicional de impostos, propiciar transporte público gratuito a toda a população brasileira.

O número de reclamações é tão grande, e o número de reclamantes é tamanho, que os políticos pela primeira vez se deram conta de que foram longe demais nos seus desmandos, e de forma apressada tentam manobras evasivas que desviem o Clamor das Ruas em uma direção mais palatável para eles. Saúde, educação, inflação, criminalidade, ENEM, caos aéreo, Boate Kiss, deslizamentos, mensalão, trânsito infernal, Renan, estádios bilionários, PEC 37, rapidamente se travestem em plebiscito, reforma política, importação de médicos cubanos, trabalho compulsório na medicina, espionagem dos americanos, e por aí vai.

Nossos dirigentes ainda não se deram conta de que o marketing político perdeu, e perdeu feio para um fenômeno sobre o qual ele não tem como exercer controle: a internet. Ao mesmo tempo em que estou batucando essas "mal escritas linhas", milhares de pessoas tão indignadas como eu estão fazendo o mesmo, se baseando em fatos que estão sendo apresentados por uma mídia livre, que tanto os poderosos têm tentado limitar. A internet não tem mecanismos de controle, e por enquanto ela está servindo àquilo que interessa às massas, e não vejo no horizonte a possibilidade de desviá-la dessa direção; trata-se portanto de uma grandeza vetorial, que possui módulo e orientação.

Mas eles insistem. Entendem que ainda há espaço para enganação. O 40° ministro João Santana comanda este circo de marionetes de cima da sua fama de infalível. Segundo ele o que estamos vendo é uma catarse que vai perder força paulatinamente e devolver à presidente Dilma a popularidade perdida. Ela Dilma definitivamente não está à altura do que a Nação espera dela, não tem vetor, nem sequer tem uma medida certa do que está errado e, pior que isso, está cercada de incompetentes que não vão fazer nada do que foi decidido, ou que por acaso venha a ser decidido. Plagiando J. R. Guzzo, a essas alturas eu também não sei o que fazer diante de tanto descalabro, só que eu não sou a Dilma.

As manobras começaram com a proposta de uma Assembléia Constituinte. Ela foi lançada com estardalhaço pelo Governo, sem sequer se preocupar com a viabilidade de sua execução dentro das leis em vigor. Não havia a menor possibilidade e a proposta durou 24 horas. Daí podemos tirar duas conclusões: ou o governo sentiu o baque a ponto de cair num estado de profunda confusão mental, ou estamos diante de um balão de ensaio golpista.

E o que pretendia o governo petista fazer com uma reforma política às pressas? O que vem tentando há anos:
  • tirar de nós eleitores o direito de escolhermos em quem votar nas eleições legislativas, obrigando-nos a engolir uma lista fechada composta exclusivamente por quem o partido escolher;
  • implantar o financiamento público de campanha, em que seria sacado do Tesouro Nacional o dinheiro que se iria somar ao "caixa dois" reconhecido pelo Lula, com uma distribuição proporcional à representatividade dos partidos no momento. É uma forma eficaz de matar qualquer possibilidade de mudança através de eleições livres. 
O povo quer outra coisa, só que a sua capacidade de se expressar coerentemente podia ser trabalhada pelos Santanas da vida, Não pode mais. Traduzindo em miúdos, ele vê com mais nitidez os 70 bilhões da corrupção, mas já está vislumbrando os 440 bilhões da incompetência. É como se você levasse um ente querido em estado terminal para um hospital, autorizasse sua internação em uma UTI, e os médicos, ao verem tantos problemas no enfermo, chamassem o responsável e dissessem: "Estamos em dúvida se devemos entubar ou não o seu parente; qual a sua opinião? Você acha que devemos aumentar a carga de oxigênio?". Se o paciente vier a falecer a responsabilidade fica dividida, só que tem um detalhe: sou eu o contribuinte que paga as despesas do hospital, e quero ser bem atendido. Fomos nós quem elegemos essa corja para tomar as decisões corretas quanto aos destinos da Nação, e eles só fazem se aproveitar dessa delegação.

O exemplo é parecido com uma pergunta que certamente seria formulada a nós eleitores num eventual plebiscito (verifiquem a que ponto pode chegar a "embromation"):

Para eleger a Câmara Baixa você opta por:
1 - Sistema majoritário:
2 - Sistema semi-proporcional
3 - Sistema proporcional
4 - Sistema misto
5 - Método de Borda modificado

Se quiserem ir mais longe podem perguntar sobre variações desses 5 critérios:
1.1 - Escrutínio uninominal majoritário em uma volta
1.2 - Escrutínio uninominal majoritário em duas voltas
1.3 - Voto alternativo
1.4 - Escrutínio majoritário plurinominal ou misto majoritário uninominal e plurinominal
1.5 - Escrutínio de lista majoritária ou misto majoritário uninominal e majoritário de lista

e por aí vai. Chega ou quer mais? É isso que estamos pedindo? É por isso que as ruas estão clamando?

Segundo o Roberto Pompeu de Toledo, as perguntas teriam que ter enunciados simples, e ele dá um exemplo:
"Em nove oportunidades uma cliente pagou 400 Reais ao profissional que lhe fez o penteado e a maquiagem. Na décima vez, pelo mesmo serviço, foram-lhe propostos 3.125 Reais. A cliente deve concordar com a proposta? Sim ou não?"
A cliente em questão era ela mesma: Dilma: Agora vem a resposta: a nova conta foi aceita pelo menos por três vezes, segundo reportagem da Folha de São Paulo. Podemos argumentar que não se pode controlar tudo, que se trata de uma simples conta de cabeleireiro. Tudo bem; com certeza o trem bala vai ser administrado com maior controle.


Comentários

  1. Respostas
    1. Acho que toquei em itens importantes. O assunto é vasto...

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  2. É isso aí, Fonte. Se depois de 10 anos no poder o pessoal lá de cima ainda precisa de plebiscito para auferir o que deve ser feito para melhorar os serviços púbicos neste país, eu me pergunto, estarrecida: como foi que eles "governaram" até agora? A nau parece mesmo estar à deriva.

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  3. O assunto é tão vasto quanto as despesas de custeio que esta semana atingiram 1 trilhão de Reais. Paciência. Fomos nós que elegemos esses caras.

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