Abro o caderno de economia do Estadão de 19/07, página 2: "Mendoza negocia crédito do BNDES para usina". Ficamos então sabendo que o governador de Mendoza, estado argentino, está no Brasil para conseguir empréstimo para a construção de uma usina hidrelétrica no valor de U$ 1,2 bilhões, a ser executada pela brasileira OAS. Na página 6 ficamos sabendo que o BNDES e a Caixa puxam a alta da dívida pública. Foram emitidos títulos para ampliar o capital dos bancos, no valor de R$ 23 bilhões, o que ajudou a aumentar a dívida pública em 2,6%, para o total de R$ 1,085 trilhões.
A conclusão a que chegamos é a de que o BNDES é um instrumento importante da estratégia petista de se perpetuar no poder, e vamos tentar aqui, com base no que lemos na mídia, deixar isso claro.
Em 2009, em uma entrevista de Guido Mantega ao Finantial Times, foi lançada a pedra fundamental do que podemos chamar de Zé com Zé do governo. Zé com Zé é como são chamadas as transações feitas entre corretoras no mercado financeiro com o objetivo de puxar as cotações para cima ou para baixo. Iria funcionar assim: como o governo não contava com recursos para investir, ele iria recorrer ao investimento privado financiado com recursos do governo (???). O agente dessa tramóia seria o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social, BNDES, vinculado ao Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior. A revista Exame de 24/07 mostra como ela funciona, já agora chamada de "contabilidade criativa", que tanta desconfiança tem trazido ao mercado:
Já com os "campeões nacionais" a coisa é mais pulverizada, mas não menos grandiosa. O BNDES disponibilizou R$ 4,5 bilhões para viabilizar a fusão entre o Pão de Açúcar e o Carrefour, sem que o controlador, o Pão de Açúcar, sequer tivesse conhecimento da armação feita pelo Senhor Abilio Diniz. Com as empresas X do Senhor Eike Batista o BNDES tem comprometida a bagatela de R$ 11,5 bilhões, que têm como garantia as ações das empresas de Eike.
A coisa não para entre esses grandões. A BNDES Participações (BNDESPar), subsidiária do Banco que tem participação direta nas empresas, detinha 30% do capital da LBR, dona da Parmalat, e em fevereiro teve que declarar baixa contábil de R$ 657 milhões pela quebra da empresa. Junte-se a esse caso as participações na Indústria de Alimentos Nilza, no Curtune Braspelco e no Frigorífico Independência, todos no buraco.
Vemos então a existência de duas estratégias: financiamentos bilionários a juros subsidiados e participação direta através do BNDESPar, ambas com a finalidade de criar os tais campeões nacionais. Seria então o caso de se perguntar, dado o orçamento controlado do governo, qual teria sido a contribuição dos R$ 370 bilhões do BNDES para cobrir a carência dos investimentos em infraestrutura urbana, em especial no transporte de massa, motivo de tanta revolta popular: quase zero, o trem bala é prioridade nessa área.
Mas a coisa não para por aqui. Vamos falar dos empréstimos subsidiados aos "países amigos": Argentina, Venezuela, Cuba, africanos, etc. O que tem um banco de fomento ao desenvolvimento nacional a ver com isso? Tem a ver o fato citado no início deste post: por trás do empreendimento tem uma empresa nacional responsável por tocar o projeto. Só em 2012 foram destinados US 2,2 bilhões só para essa ação entre compadres. Os maiores beneficiários foram Angola com US$ 654 milhões, Estados Unidos (???) com US$ 259 milhões, Argentina com US$ 245 milhões, República Dominicana com US$ 237 milhões e a "hermana" Cuba com US$ 220 milhões. Questionado, o banco respondeu que "o BNDES não financia países, mas sim exportações de bens e serviços que geram emprego e renda ao país". Senhor Coutinho, esses US$ 2,2 bilhões, se empregados em obras de infraestrutura nas nossas áreas carentes, gerariam a mesma quantidade de empregos, e o retorno seria total por se tratar de obras realizadas aqui.
É claro que o Senhor Luciano Coutinho não me conhece na minha insignificância, mas eu o conheço bem, já que trabalhei na área de tecnologia por décadas e comparecia a palestras na Unicamp, onde ele costumava defender políticas que eu considerava heterodoxas. Vou citar dois casos:
Resumindo isso tudo, as operações bilionárias do BNDES são um enorme prejuízo para o Tesouro, e são parte da estrategia do governo de turbinar a economia através de decisões erradas. A dívida dos bancos oficiais junto ao Tesouro passou de R$ 14 bilhões em 2007 (0,5% do PIB) para R$ 406 bilhões em 2012 (9,2% do PIB), sendo que 90% desse valor se refere ao BNDES, Como o Tesouro paga mais na captação desse dinheiro do que recebe do BNDES em forma de juros (8,5% contra 5%), o custo anual desse arranjo é de cerca de R$ 18 bilhões a serem pagos pelo consumidor.
Estamos portanto caminhando rapidamente para a situação em que os bancos públicos terão uma dívida para com o Tesouro de 10% do PIB, e isso significa encrenca na certa. Junte-se a isso tudo o uso do dinheiro do Fundo de Amparo ao Trabalhador (FAT), que é na realidade a segunda fonte de recursos do BNDES. O FAT tem como objetivo o pagamento de seguro desemprego, e esse dinheiro está sendo encaminhado para o BNDES, que o emprega nessas operações de risco. Apenas em 2012 o FAT tranferiu R$ 17 bilhões ao BNDES, que junto com os repasses do Tesouro representam 80% das fontes do BNDES, as quais estão sendo usadas em operações de risco sem um retorno que satisfaça o principal investidor, o trabalhador brasileiro.
Em entrevista às páginas amarelas da Veja de 24/07, André Esteves, dono do BTG Pactual, disse "não achar certo o BNDES dar crédito barato a empresas que têm como conseguir dinheiro no mercado .... o BNDES é tão bom quanto o antibiótico, que foi uma grande invenção mas que se você tomar oito por dia vai acabar prejudicando a sua saúde ..... se todo mundo ficar pendurado no BNDES o país perde competitividade .... o banco deveria, isso sim, se concentrar nos grandes projetos de infraestrutura que podem ajudar o Brasil a enfrentar a concorrência global". Assino embaixo.
Para tanto é necessário competência, visão estratégica, e para isso precisamos de um estadista que procure no mercado as pessoas certas para tomarem essas decisões.
A conclusão a que chegamos é a de que o BNDES é um instrumento importante da estratégia petista de se perpetuar no poder, e vamos tentar aqui, com base no que lemos na mídia, deixar isso claro.
Em 2009, em uma entrevista de Guido Mantega ao Finantial Times, foi lançada a pedra fundamental do que podemos chamar de Zé com Zé do governo. Zé com Zé é como são chamadas as transações feitas entre corretoras no mercado financeiro com o objetivo de puxar as cotações para cima ou para baixo. Iria funcionar assim: como o governo não contava com recursos para investir, ele iria recorrer ao investimento privado financiado com recursos do governo (???). O agente dessa tramóia seria o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social, BNDES, vinculado ao Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior. A revista Exame de 24/07 mostra como ela funciona, já agora chamada de "contabilidade criativa", que tanta desconfiança tem trazido ao mercado:
- O Tesouro emite títulos com base na taxa Selic, de 8,5% ao ano, o que vem a aumentar a dívida da União (vide notícia acima);
- Esse recursos são emprestados ao BNDES, e são registrados no Tesouro como crédito a receber;
- O Banco tem um aumento de caixa e registra uma dívida junto ao Tesouro;
- Ele empresta esses recursos a juros subsidiados, baseados na TJLP (5% ao ano);
- Essa diferença de 3,5% é bancada pelo Tesouro, o que leva o Banco a ter lucro na operação.
- Os dividendos do Banco são repassados ao Tesouro, o que aumenta a sua receita. Quando necessário eles são até antecipados.
Desde 2007 estima-se que R$ 370 bilhões tenham sido transferidos do Tesouro para o BNDES, e embora eles tenham sido captados no mercado para cobrir as deficiências do orçamento, sua destinação final foi totalmente desvirtuada. De um lado tínhamos a dura realidade do orçamento, sem essa captação, e do outro o paraíso do BNDES, onde havia dinheiro para tudo. Essa enxurrada de dinheiro a baixo custo acabou por se tornar um ingrediente que turbina a inflação enquanto o Banco Central faz malabarismos para controlar a moeda.
Mas isso não é tudo: foram criados projetos grandiosos, megalomaníacos, desde o que veio a se chamar de criação de "campeões nacionais", que não era mais do que um deliberado cerceamento da concorrência, até projetos do tipo trem bala, uma verdadeira insânia.
Comecemos pelo trem bala. Em setembro de 2009 o governo anunciou o polêmico projeto, que ligará Campinas, São Paulo e o Rio de Janeiro, onde o consórcio vencedor teria acesso a R$ 20,7 bilhões de empréstimos do BNDES a juros subsidiados, o que equivaleria a 60% do custo então estimado da obra. Foram feitas três tentativas de leilão entre 2010 e 2011, todas felizmente fracassadas.
A coisa não para entre esses grandões. A BNDES Participações (BNDESPar), subsidiária do Banco que tem participação direta nas empresas, detinha 30% do capital da LBR, dona da Parmalat, e em fevereiro teve que declarar baixa contábil de R$ 657 milhões pela quebra da empresa. Junte-se a esse caso as participações na Indústria de Alimentos Nilza, no Curtune Braspelco e no Frigorífico Independência, todos no buraco.
Vemos então a existência de duas estratégias: financiamentos bilionários a juros subsidiados e participação direta através do BNDESPar, ambas com a finalidade de criar os tais campeões nacionais. Seria então o caso de se perguntar, dado o orçamento controlado do governo, qual teria sido a contribuição dos R$ 370 bilhões do BNDES para cobrir a carência dos investimentos em infraestrutura urbana, em especial no transporte de massa, motivo de tanta revolta popular: quase zero, o trem bala é prioridade nessa área.
Mas a coisa não para por aqui. Vamos falar dos empréstimos subsidiados aos "países amigos": Argentina, Venezuela, Cuba, africanos, etc. O que tem um banco de fomento ao desenvolvimento nacional a ver com isso? Tem a ver o fato citado no início deste post: por trás do empreendimento tem uma empresa nacional responsável por tocar o projeto. Só em 2012 foram destinados US 2,2 bilhões só para essa ação entre compadres. Os maiores beneficiários foram Angola com US$ 654 milhões, Estados Unidos (???) com US$ 259 milhões, Argentina com US$ 245 milhões, República Dominicana com US$ 237 milhões e a "hermana" Cuba com US$ 220 milhões. Questionado, o banco respondeu que "o BNDES não financia países, mas sim exportações de bens e serviços que geram emprego e renda ao país". Senhor Coutinho, esses US$ 2,2 bilhões, se empregados em obras de infraestrutura nas nossas áreas carentes, gerariam a mesma quantidade de empregos, e o retorno seria total por se tratar de obras realizadas aqui.
É claro que o Senhor Luciano Coutinho não me conhece na minha insignificância, mas eu o conheço bem, já que trabalhei na área de tecnologia por décadas e comparecia a palestras na Unicamp, onde ele costumava defender políticas que eu considerava heterodoxas. Vou citar dois casos:
- Em uma de suas perorações ele afirmou parecer incrível que ainda existisse gente que achava que a criação da Petrobras foi um erro. Pedi a palavra e argumentei que as decisões políticas dessa abrangência não podiam ser avaliadas dessa forma; por exemplo, se não tivesse sido criada a Petrobras o consumidor estaria pagando mais ou menos pelo litro de gasolina? Se fosse possível, se definiria que a Petrobras produziria gasolina para os cidadãos que morassem nos lados pares das ruas do país e a iniciativa privada seria responsável pelos lados ímpares. Decorridos alguns anos, bastava verificar a migração dos lados pares para os lados ímpares e vice versa e só então seria tomada a decisão certa. Ele disse que não tinha entendido o meu argumento.
- Noutra ocasião ele afirmou, como era voz comum na época, que as telecomunicações eram "serviços essenciais" e deveriam permanecer sob responsabilidade total do governo. Eu argumentei que essa conexão entre telecomunicações e serviços essenciais foi criada por Theodore Vail, presidente da American Telephone & Teleghaph (AT&T) com a finalidade de convencer os congressistas americanos a lhe conceder o monopólio desse serviço, o que foi feito, e os americanos só foram se livrar desse fardo em 1984. Ele disse que não tinha entendido o meu argumento.
Resumindo isso tudo, as operações bilionárias do BNDES são um enorme prejuízo para o Tesouro, e são parte da estrategia do governo de turbinar a economia através de decisões erradas. A dívida dos bancos oficiais junto ao Tesouro passou de R$ 14 bilhões em 2007 (0,5% do PIB) para R$ 406 bilhões em 2012 (9,2% do PIB), sendo que 90% desse valor se refere ao BNDES, Como o Tesouro paga mais na captação desse dinheiro do que recebe do BNDES em forma de juros (8,5% contra 5%), o custo anual desse arranjo é de cerca de R$ 18 bilhões a serem pagos pelo consumidor.
Estamos portanto caminhando rapidamente para a situação em que os bancos públicos terão uma dívida para com o Tesouro de 10% do PIB, e isso significa encrenca na certa. Junte-se a isso tudo o uso do dinheiro do Fundo de Amparo ao Trabalhador (FAT), que é na realidade a segunda fonte de recursos do BNDES. O FAT tem como objetivo o pagamento de seguro desemprego, e esse dinheiro está sendo encaminhado para o BNDES, que o emprega nessas operações de risco. Apenas em 2012 o FAT tranferiu R$ 17 bilhões ao BNDES, que junto com os repasses do Tesouro representam 80% das fontes do BNDES, as quais estão sendo usadas em operações de risco sem um retorno que satisfaça o principal investidor, o trabalhador brasileiro.
Em entrevista às páginas amarelas da Veja de 24/07, André Esteves, dono do BTG Pactual, disse "não achar certo o BNDES dar crédito barato a empresas que têm como conseguir dinheiro no mercado .... o BNDES é tão bom quanto o antibiótico, que foi uma grande invenção mas que se você tomar oito por dia vai acabar prejudicando a sua saúde ..... se todo mundo ficar pendurado no BNDES o país perde competitividade .... o banco deveria, isso sim, se concentrar nos grandes projetos de infraestrutura que podem ajudar o Brasil a enfrentar a concorrência global". Assino embaixo.
Para tanto é necessário competência, visão estratégica, e para isso precisamos de um estadista que procure no mercado as pessoas certas para tomarem essas decisões.
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