Muito temos lido sobre o fato do nosso pais ser injusto; que ele cobra do seu cidadão um pedágio que não lhe é retribuído em serviços como saúde, educação, segurança, infraestrutura, etc. Uma medida que é utilizada pelos economistas para avaliar essa relação é tomar a carga tributária de um país e dividi-la pelo índice de desenvolvimento humano, o chamado IDH. Quanto menor esse valor, melhor seria o retorno do Poder Público para o cidadão.
Resolvi então verificar essa relação Carga Tributária / IDH, principalmente pelo fato do Brasil, em 30º lugar na figura, estar acompanhado de vizinhos tão ilustres como Finlândia e Dinamarca. Procurei na Wikipedia as cargas tributárias e os IDHs dos 30 países listados acima. Encontrei esses dados nos sites:
onde a carga tributária é referente ao ano 2012 e o IDH ao ano 2017. O ideal aqui seria que os dados fossem do mesmo ano, o que não consegui encontrar, mas entendo que isso não invalida as conclusões a que vamos chegar.
Encontrei como resultado a tabela abaixo. Nela o Brasil está com uma carga tributária de 34% do PIB e um IDH de 0,759. Aqui é bom entender o que dizem esses números:
- Uma carga tributária de 34% significa que 34% do nosso Produto Interno Bruto é arrecadado pelo governo (federal. estadual e municipal) com a finalidade de fazer funcionar toda a máquina pública
- Um IDH ideal teria o valor 1,000. A Noruega, com 0,953, pode ser considerada como o país com o melhor índice de desenvolvimento humano. O Brasil, com 0,759, está em 79º lugar numa lista de 189 países, que tem o Níger com 0,354 em último lugar.
A meu ver o que se tem que avaliar é a relação entre a carga tributária e o PIB per Capita. Voltei á Wikipedia e encontrei o que queria em: https://pt.wikipedia.org/wiki/Lista_de_pa%C3%ADses_por_PIB_nominal_per_capita .
Agora temos o Brasil no lugar certo, com os vizinhos certos. Entre as 30 nações com carga tributária elevada escolhidas ficamos em 28º lugar, perto de Eslovênia, República Tcheca, Argentina e Hungria. A Hungria em particular é ~28% mais "injusta" que o Brasil. Quanto menor o PIB per Capita maior tende a ser a relação Carga Tributária / PIB per Capita. O Níger já citado por exemplo, tem uma Carga Tributária e 11% e um PIB per Capita de 405 dólares, o que lha dá o quociente impressionante de 27,16 (!!!). A conclusão é que o Brasil é injusto, pero no mucho. Há mais de cem de países com esse índice pior que o nosso.
É claro que o mundo é injusto. Prova disso são os movimentos migratórios atuais, com hordas de famintos e fugitivos da violência migrando em direção ao norte do planeta, onde o IDH é mais elevado. Dizer a um ser humano que ele não pode fazer isso é assunto para vários Posts, e o que eu quero fazer aqui é algo mais ameno: uma comparação entre as cidades que votaram em Bolsonaro e as que votaram em Hadad.
IDH
IDH
Haddad Bolsonaro
O Estadão de 29/10 nos afirma que Haddad ganhou em 2.810 cidades e Bolsonaro em 2,760, mas mesmo assim Bolsonaro ganhou a eleição com 10,7 milhões de votos de diferença.
Na figura acima, copiada do Estadão, temos que a linha vertical no meio dela marca a divisão Haddad / Bolsonaro, em verde as cidades onde Bolsonaro ganhou e em vermelho aquelas onde Haddad venceu. Quanto mais abaixo (menor o IDH), mais ganha Haddad, quanto mais acima (IDH maior) maior a chance de Bolsonaro. O IDH está mostrado na vertical.
Podemos concluir que cidades ricas votam em geral na direita e cidades mais pobres votam na esquerda:
- A cidade na extrema esquerda é Guaribas, PI, onde Haddad teve a maior votação proporcional, 98%
- A mais abaixo é Melgaço, Pa, com o menor IDH e 75,6% para Haddad
- A mais à direita é Nova Pádua, RS, onde Bolsonaro teve a maior votação proporcional, 93%
- A mais acima é São Caetano, SP, maior IDH e 75,1% para Bolsonaro
- As bolas grandes acima à direita são as capitais do sudeste, sul e centro oeste (São Paulo, Rio, ...)
- As bolas grandes à esquerda são as capitais do nordeste e norte (Fortaleza, Salvador, ...)
Podemos concluir que uma nação "justa" possui essa nuvem como as nuvens devem ser: horizontais. Sendo a nuvem horizontal, a distância entre o maior IDH e o menor diminui, e assim fica mais fácil evitar a polarização esquerda x direita que temos por aqui. No entanto não é verdade que as injustiças sociais levam as regiões de IDH menor para a esquerda e as de maior IDH para a direita; nos Estados Unidos ocorre exatamente o contrário, onde os por lá chamados de "liberais" crescem nas regiões de IDH maior. Ou seja, as injustiças sociais levam à polarização, e a direção tomada vai depender do que chamaríamos de "cultura" da sociedade.
De qualquer forma a polarização política ocorre se a injustiça social é grande, e o Brasil possui todos os ingredientes que nos levam a essa polarização
A imagem acima é a que melhor representa o nosso espectro social. Ela mostra a favela de Paraisópolis em São Paulo com prédios de luxo ao fundo.
"Pergunte ao Criador quem pintou essa aquarela. Livre do açoite da senzala, preso na miséria da favela"
Com uma população negra e parda maior que 50% do seu total, seria de se esperar que o preconceito racial passasse ao largo das nossas relações sociais. Isso não é verdade, e o pior é que existe muita hipocrisia nessa realidade. Raramente o brasileiro individualmente se declara racista, mas basta se reunir em grupos que surgem as piadas.
Não resta dúvida quanto à nossa condição de sociedade racista. As estatísticas estão aí para confirma essa realidade e seria enfático listá-las.O que seria necessário entender são os seus motivos.
A começar, nós fomos o último país a libertar os escravos em nosso continente. A nível mundial apenas 4 países africados aboliram a escravidão depois de nós. Ao contrário das colônias do norte americano, no entanto, as colônias latinas, em particular as nossas capitanias portuguesas, se miscigenaram muito mais. Isso deveria ser considerado um fator positivo na direção da integração racial; só que aconteceu exatamente o contrário.
Nossa cultura católica, ao contrário da protestante no norte, era muito mais perniciosa e o uso da negra como objeto sexual era muito mais aceito. Essa atitude deixou claro no imaginário da sociedade o fato de que os negros eram mais que escravos no sentido de realizar as tarefas mais pesadas. A posição dos negros sempre foi muito mais próxima dos brancos, mas sempre claramente eivada de preconceito.
O aspecto nitidamente rural das nossas comunidades nos levou a alongar o período de escravidão, já que o nosso Lincoln, na figura da Princesa Isabel, demorou a aparecer; houve uma diferença de 17 anos numa época em que o Iluminismo se difundia rapidamente em toda a América. Com isso o negro demorou muito mais a ser considerado algo superior aos animais das fazendas. Ao contrário dos Estados Unidos, o Brasil era quase cem por cento rural, e isso foi bom porque não houve guerra com o intuito de resolver esse problema, mas também a efetivação da abolição, que nos Estados Unidos só veio a acontecer 90 anos depois com Lindon Jonhson, por aqui ainda está por acontecer. As leis brasileiras são claras, mas a prática não é.
A famigerada Globo, que já tinha dado uma contribuição enorme à questão da taxa de natalidade, que sem nenhuma política pública decresceu vertiginosamente, também está dando uma mão na questão racial. Assim como as famílias das novelas têm poucos filhos, a percentagem de negros em posições superiores está crescendo bastante, e isso é bom. Os negros deixaram de aparecer na tela apenas como empregadas ou porteiros e motoristas.
Estou assistindo à última temporada de House of Cards. Embora a Claire não tenha nem metade do carisma do Francis, continuo assistindo à série, e me impressiona o volume de negros entre os personagens importantes. Essa é uma mensagem subliminar de extremo valor que eu entendo que a Globo está replicando por aqui.
Terminando a minha arenga, numa época em que o mundo está caminhando para uma polarização social, que inclui o problema racial, entendo que o Brasil, pra variar, não se encontra em uma posição satisfatória, Vamos esperar que os arroubos do nosso presidente, no qual votei para evitar o pior, não leve os fanáticos (que existem a ponto que tê-lo esfaqueado) a se entenderem autorizados a voltar à velha prática da intolerância.
O problema existe. Não devemos ignorá-lo. Basta olhar para o norte.
"Pergunte ao Criador quem pintou essa aquarela. Livre do açoite da senzala, preso na miséria da favela"
Samba enredo 1988, Estação Primeira de Mangueira
Com uma população negra e parda maior que 50% do seu total, seria de se esperar que o preconceito racial passasse ao largo das nossas relações sociais. Isso não é verdade, e o pior é que existe muita hipocrisia nessa realidade. Raramente o brasileiro individualmente se declara racista, mas basta se reunir em grupos que surgem as piadas.
Não resta dúvida quanto à nossa condição de sociedade racista. As estatísticas estão aí para confirma essa realidade e seria enfático listá-las.O que seria necessário entender são os seus motivos.
A começar, nós fomos o último país a libertar os escravos em nosso continente. A nível mundial apenas 4 países africados aboliram a escravidão depois de nós. Ao contrário das colônias do norte americano, no entanto, as colônias latinas, em particular as nossas capitanias portuguesas, se miscigenaram muito mais. Isso deveria ser considerado um fator positivo na direção da integração racial; só que aconteceu exatamente o contrário.
Nossa cultura católica, ao contrário da protestante no norte, era muito mais perniciosa e o uso da negra como objeto sexual era muito mais aceito. Essa atitude deixou claro no imaginário da sociedade o fato de que os negros eram mais que escravos no sentido de realizar as tarefas mais pesadas. A posição dos negros sempre foi muito mais próxima dos brancos, mas sempre claramente eivada de preconceito.
O aspecto nitidamente rural das nossas comunidades nos levou a alongar o período de escravidão, já que o nosso Lincoln, na figura da Princesa Isabel, demorou a aparecer; houve uma diferença de 17 anos numa época em que o Iluminismo se difundia rapidamente em toda a América. Com isso o negro demorou muito mais a ser considerado algo superior aos animais das fazendas. Ao contrário dos Estados Unidos, o Brasil era quase cem por cento rural, e isso foi bom porque não houve guerra com o intuito de resolver esse problema, mas também a efetivação da abolição, que nos Estados Unidos só veio a acontecer 90 anos depois com Lindon Jonhson, por aqui ainda está por acontecer. As leis brasileiras são claras, mas a prática não é.
A famigerada Globo, que já tinha dado uma contribuição enorme à questão da taxa de natalidade, que sem nenhuma política pública decresceu vertiginosamente, também está dando uma mão na questão racial. Assim como as famílias das novelas têm poucos filhos, a percentagem de negros em posições superiores está crescendo bastante, e isso é bom. Os negros deixaram de aparecer na tela apenas como empregadas ou porteiros e motoristas.
Estou assistindo à última temporada de House of Cards. Embora a Claire não tenha nem metade do carisma do Francis, continuo assistindo à série, e me impressiona o volume de negros entre os personagens importantes. Essa é uma mensagem subliminar de extremo valor que eu entendo que a Globo está replicando por aqui.
Terminando a minha arenga, numa época em que o mundo está caminhando para uma polarização social, que inclui o problema racial, entendo que o Brasil, pra variar, não se encontra em uma posição satisfatória, Vamos esperar que os arroubos do nosso presidente, no qual votei para evitar o pior, não leve os fanáticos (que existem a ponto que tê-lo esfaqueado) a se entenderem autorizados a voltar à velha prática da intolerância.
O problema existe. Não devemos ignorá-lo. Basta olhar para o norte.
Boa Fonte; muito esclarecedor
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