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O Processo Eleitoral Americano

Diz o dito popular que é mais fácil ser historiador do que profeta, e é claro que isso vale para o Processo Eleitoral Americano. No entanto temos que convir que as eleições americanas estão cada vez mais previsíveis.

Ele funciona mais ou menos assim: Os Republicanos buscam um candidato o mais fundamentalista possível. Os Democratas buscam um candidato o mais capaz possível de arregimentar as camadas menos favorecidas da sociedade: as mulheres, os negros, os latinos, os imigrantes em geral, e torcem para que o escolhido do outro lado jogue a agora minoria branca contra os seus eleitores.

Donald Trump atende com perfeição a esse quesito, e hoje terá início em Iowa a chatíssima sucessão de primárias que irá escolher os candidatos Republicano e Democrata. Diz a The Economist que se trata do maior torneio eleitoral do planeta, mas ao que parece ele está em um processo de tirar das elites políticas o controle sobre o seu desenlace.

Senão vejamos: Do lado Democrático Hillary Clinton tem uma posição no meio político americano "mais sólida que o monumento de Washington", mas está com sua indicação ameaçada por um senador mequetrefe de um estado menor, Bernie Sanders, que não teme se declarar "socialista democrático". Já do lado Republicano as coisas estão piores, pois os postulantes "razoáveis", como Jeb Bush e Marco Rubio, estão sendo alijados por dois falastrões, Ted Cruz e Donald Trump.

Uma ano atrás ninguém duvidava que a escolha seria feita entre um Bush e um Clinton, já que os americanos têm profunda simpatia pela coroa inglesa (fizeram até filme em que um americano acaba se tornando Rei da Inglaterra), e nada melhor para o seu Ego que transformar a eleição numa espécie de coroação. Só que as coisas parece que estão desandando.

A perda do controle sobre política por parte do establishment não é uma característica americana. O Partido Trabalhista inglês não consegue indicar um candidato minimamente viável em termos eleitorais, por estar nas mãos de um esquerdista radical. A Frente Nacional francesa, de extrema direita, cresce de forma descontrolada. Os populistas ganharam as eleições na Hungria e na Polônia, e vão ganhar na Holanda, e na Suécia a xenofobia grassa, tendo chegado a 30% das preferências eleitorais.

Mas vamos voltar aos gringos: é um fato que os brancos cristãos se tornaram em 2015 minoritários nos Estados Unidos. Há então duas alternativas políticas a essa situação: a mais razoável é aceitar esse fato e criar mecanismos para ganhar o voto dos não brancos cristãos; a outra é o apelo ao populismo, se é que podemos falar de populismo uma politica de ódio que favorece minorias. Na política externa a posição americana já não é tão confortável quanto era quando da derrocada da União Soviética, com a China se tornando protagonista, e com o fracasso da sua política no Oriente Médio.

Outro problema é que a única chance de arrivistas como Trump e Sanders se elegerem é tomar de assalto os únicos partidos viáveis: o Republicano e o Democrata, já que a história deixa claro que candidaturas independentes, como a de Ross Perrot em 1992, não vingam. O cenário vira como que um filme de horror: caso Trump e Sandres consigam a nomeação será decretada a falência daquela que se intitula a maior democracia do mundo, com dois extremistas disputando a primazia de ter nas mãos o botão da bomba.

Essas coisas ocorrem por lá porque o colégio eleitoral, as primárias, só atraem 20% dos eleitores, exatamente aqueles que têm como objetivo mudar o status quo. Essa situação é um campo fértil para o surgimento dos oportunistas. No início das campanha, o que estamos vivendo hoje mesmo, eles chegam até a vencer as primeiras primárias, mas perdem força em seguida. Houve um caso em que um republicano populista chegou a conseguir a indicação, mas Barry Goldwater perdeu em 44 dos 50 estados em 1964.

Os Democratas estão mais tranquilos que os Republicanos. Mesmo que Hillary perca em Iowa e New Hampshire, ela tem forte apoio no sul e sua campanha tem muito recurso financeiro. Estima-se que ela ganhe com folga a indicação, mas é um incômodo ter um socialista nos seus calcanhares.

Já do lado Republicano as coisas estão mais complicadas. Trump atropelou a máquina partidária, e seu único rival viável, Cruz, no momento é ainda mais desprezado pelos figurões do partido. Se houver uma reviravolta e nenhum dois dois for o indicado a campanha se torna desnecessária e Hillary ganha com facilidade. Os Democratas só perdem se cometerem o desatino de indicar Sanders.

É sabido que o eleitorado americano está dividido ao meio, com a eleição sendo decidida em meia dúzia de estados. E isso não é bom, mas é praticamente impossível mudar o Processo. Ficamos então na dependência de que nenhum acidente ocorra para que a eleição siga seu curso normal. Um atentado ou um escândalo pode pôr tudo a perder.

Mas nem tudo é negativo. Os Estados Unidos são a nação desenvolvida em melhor situação econômica, o desemprego está baixo, os índices de criminalidade também. E os Republicanos, que passaram 8 anos desancando Barak Obama têm pouco o que dizer, ainda mais com Trump atravessado em suas gargantas.

Como já disse, não sou profeta mas aposto na Hillary, embora não simpatize com ela. Paciência, eu votei no Aécio por exclusão.

Em tempo: O Estadão de hoje traz uma análise perfeita de Fareed Zakaria sobre os dois candidatos Republicanos. Segundo ele existem duas revoltas no partido: a liderada por Cruz e a liderada por Trump.

Resumindo, os Democratas criaram todas as políticas sociais: o New Deal, que instituiu a seguridade social, a Great Society, que criou o Medicare, e o Obamacare. Os Republicanos se elegeram prometendo acabar com a ingerência do governo na vida dos americanos, mas nunca fizeram nada de concreto. Conclusão: os americanos em teoria são contra esses programas mas na prática os aceitam e não querem sua extinção.

Vamos às revoltas:
  • Cruz promete acabar com o Obamacare, abolir a Receita Federal, substituir o imposto  de renda por um imposto único de 10%, e proporá uma emenda à Constituição impondo um orçamento equilibrado (o que implicaria em um imenso corte de gastos).
  • Trump ataca mais de perto das ansiedade do americano branco cristão, hostilizando os muçulmanos, os afro-americanos e até as mulheres (vide caso Carly Fiorina).
Com uma mão de cartas como essa vai ser difícil ganhar. 

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