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A nova divisão política: Fronteiras Abertas x Fronteiras Fechadas

Segundo a revista The Economist, a divisão ideológica entre esquerda e direita já era, ou está limitada aos países subdesenvolvidos com seus sindicatos pelegos. Hoje a divisão é entre os que entendem que as fronteiras devem fechar ou continuar abertas. Prova disso foram as convenções dos partidos americanos recentemente realizadas.

A rigor havia pouca diferença, no que diz respeito à política externa, entre a proposta do republicano Trump e a do democrata Sanders. Sorte que Hillary Clinton conseguiu evitar que os dois partidos viessem a indicar "fechadistas" ("americanistas e não globalistas", como disse Trump, mas poderia ter sido Sanders).

A Europa não fica atrás: os partidos populistas europeus hoje têm uma representação duas vezes maior que no ano 2.000, e participam, em coalizões, do governo de 9 países. Isso pra não falar na grande vitória dos anti globalistas na Grã Bretanha, onde a cínica pregação do Brexit rachou ao meio os grandes partidos. É bom lembrar que a Europa adora uma guerrinha, quando não uma guerrona, e que o fracasso da União Européia com certeza vai ressuscitar esses instintos por todo o continente.

Todo o progresso mundial alcançado nos últimos 70 anos se deve à forte ação americana na imposição de regras e alianças. Graças a elas se viabilizaram a reconstrução da Europa após a Segunda Guerra Mundial, a queda do comunismo, e a integração da China, a qual resultou na maior redução da pobreza já vista.

Se a corrente "murista" vencer, o resultado será um mundo mais pobre e perigoso. A Europa vai voltar a ser um punhado de vizinhos briguentos, o que vai acelerar ainda mais a sua decadência. A retirada dos Estados Unidos do protagonismo mundial será preenchida pelo aparecimento dos aproveitadores, com visão bem menos clara quanto à defesa da democracia.

Mesmo que tenhamos a sorte de não virmos a ter um Donald Trump como presidente, o simples fato de ele ter defendido o não cumprimento de tratados internacionais importantes vai com certeza levar países aliados a encarar os Estados Unidos como um país menos confiável, o que vai colocar Hillary numa posição difícil. A proposta de Trump de não defender os aliados bálticos nada tem a ver com a política: ela é o resultado da sua relação incestuosa com magnatas russos que investem pesadamente nos seus negócios. Daí o apoio antes impensável de Putin a um candidato do partido de Ronald Reagan, o presidente que derrotou o Estado Comunista Russo (é bom lembrar que a maior fonte de renda de Trump são seus cassinos, e pelo visto é assim que ele trata as instituições globais).

Os riscos são grandes. A Grã Bretanha já está caminhando para uma grande recessão, com empresas planejando se mudar para o continente. Marine Le Pen pode muito bem vencer as eleições francesas e também levar a França para fora da UE, levando-a ao colapso.

E o que fazem os defensores das fronteiras abertas? Eles pelo visto estão acossados, com medo de lembrar aos americanos que a Otan é importante para manter quieto o urso russo. Apenas Juntin Trudeau, do Canadá, tem a coragem de defender francamente a abertura. Mesmo Hillary, por necessidade de cooptar os eleitores pró Sanders, se viu obrigada a incorporar várias de suas propostas isolacionistas.

Dizer que o fluxo migratório para a Europa é resultado apenas de litígios religiosos é simplificar em demasia o problema e localizá-lo apenas no Oriente Médio. O comércio internacional transformou países em desenvolvimento em todo o mundo em perdedores, e criou essa horda que ameaça destruir o status social dos países desenvolvidos, os causadores desse estado de coisas. Criar barreiras é a solução mais simples de ser apresentada às comunidades que se sentem prejudicadas, mas não é a maneira adequada. Está provado que políticas arrojadas, com forte investimento em infraestrutura, garantiriam aos imigrantes o acesso ao trabalho e os levariam a aceitar as regras impostas pela comunidade que os iria acolher, em vez de relegá-los aos guetos da periferia das grandes metrópoles. O Brasil, por ter dimensões continentais, trata esse problema com a mesma displicência que os europeus e os americanos, só que principalmente a nível interno. Isso leva a uma onda de separatismo por parte dos estados ricos, que exploram os pobres através do recolhimento do ICMS na origem. Também nós estamos criando muros, e o nosso Trump já está a caminho, e responde pelo nome de Bolsonaro.

A solução para os defensores da manutenção das fronteiras abertas passa pela reação aos profetas do isolacionismo. Na Holanda e na Suécia os partidos moderados conseguiram evitar que os nacionalistas vencessem as eleições. Marine Le Pen também teve contra si a junção das forças moderadas francesas, e isso deve se repetir ano que vem. Na Grã Bretanha tudo indica que existe a necessidade da criação de um novo partido liberal. já que os dois maiores estão rachados nesse assunto.

Nos Estados Unidos a solução é tapar o nariz e votar em Hillary. Sua indicação de Tim Kaine para Vice foi boa, já que ele é um globalista que fala espanhol, e com isso vai trazer muito voto latino e muçulmano. Vamos aguardar pra ver até onde Trump vai se enrolar em sua declarações.

Segundo Lúcia Guimarães, que eu leio sempre às segundas no Caderno 2 do Estadão, um livreto de 1 dólar, que foi mostrado por Khizr Khan na Convenção Democrata no seu momento mais simbólico, a Constituição dos Estados Unidos, só perde para o novo Harry Potter na lista dos mais vendidos. Num time de oradores que incluiu o casal Obama, Bill Clinton, Bernie Sanders, Khan, de improviso, discreto e humilde, ao lado se sua esposa Ghazala, falando durante 7 minutos, destruiu a candidatura de Trump da forma mais eficiente. Ele é o pai do soldado Humayan, muçulmano morto aos 27 anos em 2004 na guerra do Iraque. Cobrou de Trump quais foram os seus sacrifícios e perguntou se ele alguma vez tinha lido o livrinho que tinha na mão.

Os Democratas, através da fala de Khan, um muçulmano, trouxeram para si os valores que foram abandonados pelos Republicanos,os quais se recolheram ao isolacionismo pregado por Trump. Esse, em vez de ficar calado, não resistiu ao seu impulso e partiu para o insulto contra o casal, sugerindo que Ghazala tinha se mantido calada por imposição do marido.

O resultado não foi bom para ele:
  • Tim Kaine, candidato a Vice de Hillary: Se alguns de vocês estiverem procurando pelo partido de Lincoln, vocês têm um lar aqui no Parido Democrata (Lincoln era republicano).
  • Doug Elmets: Republicano, ex assessor de Reagan: Eu conheci Ronald Reagan. Eu trabalhei para Ronald Reagan. Donald Trump, você não é Ronald Reagan.
  • Barac Obama: Reagan chamava os EUA de "uma luminosa cidade na colina". Trump os chama de "cena do crime", que só ele pode consertar.
  • Jennifer Linn, do Grupo Republicanas por Hillary: Acredito nos valores fundamentais republicanos: liberdade, igualdade e a ideia de que há valores individuais que não podem ser subtraídos. E porque o Partido Republicano abandonou esses valores neste ano, esta republicana votará em Hillary Clinton.
  • Caroline MacCain, neta de John MacCain, senador e herói de guerra humilhado por Trump: A lealdade ao partido nunca pode triunfar sobre a lealdade ao país, e a lealdade ao partido não significa nada quando o partido foi envenenado. 
  • Lindsey Grahan, senador republicano: Só há uma maneira de se falar sobre famílias de militares mortos: com honra e respeito. 
  • Hillary Clinton: O Senhor Khan fez o maior sacrifício. E o que ouviu de Trump? Apenas insultos e uma incompreensão do que fez o nosso país grande.
  • Ricard Hanna, primeiro deputado republicano a declara voto em Hillary: Para mim não é suficiente denunciar os comentários dele; ele é despreparado para servir o partido e não pode liderar esse país. 
Os republicanos têm colecionado por décadas exemplos de mandatários que se elegeram taxando os democratas de "elite afastada da realidade". Numa cerimônia de graduação em Yale, George W, Bush se saiu com essa: "Para aqueles que se formaram com honrarias, eu digo 'ótimo'; para os estudantes acostumados com notas baixas, digo 'vocês podem ser presidentes dos EUA'". A piada em Washington é que após décadas fingindo ser um 'partido de estúpidos', os republicanos acabaram por se transformar nisso.

P.S. - O Post passado, perdoem-me os leitores, foi uma "isca". Foi a primeira vez que os brasileiros, perderam, no prazo de uma semana, o primeiro lugar no número de leitores. E logo para os russos, Um amigo meu investigou o Blog dele e viu a mesma coisa. Resumindo: o meu Blog está sendo investigado por robots russos. Até aí tudo bem, só que as minhas estatísticas perderam valor. 

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