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Gestão x Verba para Educação e Saúde

Tenho um conselho a dar aos meus "leitores / eleitores":
  • Não vote em nenhum candidato que defenda publicamente que o orçamento federal, estadual ou municipal defina um percentual mínimo para a Educação e a Saúde
  • Também não acredite naqueles que dizem que a emenda do teto dos gastos vai ser prejudicial para a Educação e a Saúde.
Quem assume essas posições está na verdade interessado em manter um valor mais elevado de dinheiro para essas atividades, consciente de que uma parcela enorme vai vazar no caminho entre a fonte e o usuário final. E boa parte dessa parcela, aquela que não se perde por pura incompetência, vai parar nos seus bolsos. 

Dirigir uma nação, um estado ou um município requer não muito mais que bom senso, aquele bom senso que um chefe de família deve ter ao tratar o seu orçamento familiar. O cidadão A tem esse bom senso e não vacila em manter uma reserva mínima de, digamos, 6 meses para lidar com as eventualidades. O cidadão B não tem essa percepção. Quando por exemplo os royalties do petróleo fecham sua torneira e o cidadão B mantinha seu esquema perdulário baseado nesses royalties, não é correto culpar o petróleo. O fluxo de caixa de um estado como o Rio de Janeiro não é muito diferente do daquele cidadão que foi demitido e, além de não ter uma reserva estratégica, estava cheio de dívidas. 

No caso da Educação e da Saúde, o que a classe média fez quando chegou a crise foi, obviamente, apertar o cinto, Conforme já foi mostrado no nosso Post de 01/12/16
 http://ceticocampinas.blogspot.com.br/2016/09/os-efeitos-da-crise-na-vida-dos.html , 
34% dos brasileiros deixaram de ter planos de saúde até aquela data, e 14% passaram os filhos da escola particular para a escola pública. Como mostrei no Post anterior a esse, eles "diminuíram a sua inflação". O mesmo tem que ser feito a nível municipal, estadual e federal. 

O argumento que diminuir essas verbas condena a sociedade ao atraso teria alguma validade se a gestão dessas importantes atividades tivesse um mínimo de competência. É sabido que ela não tem, isso em grande parte em função de que os nossos homens públicos defendem o aumento de verba mas não têm o menor interesse em melhorar a gestão. 

Vejamos um exemplo prático: o município X tem uma estrutura de Educação e Saúde exemplar. Suas escolas estão bem classificadas nas avaliações do MEC e os cidadãos estão satisfeitos com os serviços de Saúde (coisa rara, diga-se de passagem). Só que o percentual do orçamento que o município dedica a esses itens é menor que o definido por lei. O prefeito corre o risco de sofrer um processo de impeachment. Já o município Y "gasta" acima do teto nesses itens e a sua Educação e sua Saúde são uma porcaria, mas ele está de acordo com a lei. 

Vincular a qualidade dos serviços à verba a eles dedicada é uma estupidez que só se encontra em gestões públicas viciadas. Nenhum gestor de empresa privada aumenta a verba de um departamento que está com produtividade ruim; o que ele vai fazer é verificar como está a gestão desse departamento e tomar as medidas necessárias para corrigi-la.

Vamos então aos fatos. Segundo o Estadão de 25/12/16, 70% dos desvios nas cidades afetam a Educação e a Saúde. Os números são assustadores. Vejamos por estado o número de municípios onde foram detetadas fraudes nesses itens:
  1. Alagoas, com 70 municípios (69% do total)
  2. Amapá, com 5 municípios (31% do total)
  3. Mato Grosso, com 35 municípios (25% do total)
  4. Bahia, com 99 municípios (24% do total)
  5. Rondônia, com 12 municípios (23% do total)
  6. Ceará, com 40 municípios (22% do total)
  7. Mato Grosso do Sul, com 16 municípios (20% do total)
  8. Roraima, com 3 municípios (20% do total)
  9. Minas Gerais, com 163 municípios (19% do total)
  10. Paraíba, com 42 municípios (19% do total)
  11. Maranhão, com 36 municípios (17% do total)
  12. Sergipe, com 11 municípios (15% do total)
  13. Pará, com 21 municípios (15% do total)
  14. Rio de Janeiro, com 13 municípios (14% do total)
  15. Pernambuco, com 26 municípios (14% do total)
  16. Piauí, com 28 municípios (13% do total)
  17. Tocantins, com 17 municípios (12% do total)
  18. Espírito Santo, com 6 municípios (8% do total)
  19. Amazonas, com 4 municípios (6% do total)
  20. Acre, com 1 município (5% do total)
  21. Rio Grande do Sul, com 20 municípios (4% do total)
  22. Paraná, com 16 municípios (4% do total)
  23. São Paulo, com 25 municípios (4% do total)
  24. Goiás, com 8 municípios (3% do total)
  25. Rio Grande do Norte, com 5 municípios (3% do total)
  26. Santa Catarina, com 4 municípios (1% do total)
Ou seja, 13% dos municípios brasileiros tiveram fraudes descobertas. Esse número pode ser bem maior, mas é o que temos. Segundo Wagner Rosário, secretário executivo de Ministério da Transparência, no valor estimado das fraudes nos municípios, que é de R$ 4 bilhões, a Saúde e a Educação respondem por 2,8 bilhões. Estamos falando apenas das fraudes, nada a ver com a brutal incompetência que permeia essas duas áreas, somada a uma atitude sindical destrutiva. 

Para Wagner Rosário essa situação é o assassinato da esperança, o que condena o País à situação em que estamos hoje. Para ele, enquanto o povo não perceber que os benefícios particulares não estão acima dos benefícios coletivos, não haverá justiça social. Para piorar essa situação, esse crime, como podemos ver na tabela acima, é mais facilmente praticado nas regiões mais carentes. 

Mas o problema maior, maior até que as fraudes, é a gestão desses recursos. Para ele não tem muita valia aumentar o controle em ambientes onde a gestão é fraca. A tentativa atual é tentar fazer os governos entenderem a importância da gestão, delegar o comando dessas atividades a pessoas realmente capacitadas e dedicadas à melhora dos serviços.

É difícil. Como já dissemos diversas vezes nesse Blog, o Brasileiro é cordial, prioriza o seu entorno e possui uma visão míope do social. 

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